STJ fixa que a taxa SELIC é o índice aplicável aos juros moratórios civis até a Lei 14.905/2024

A Corte Especial do Superior Tribunal de Justiça (STJ) fixou, no julgamento conjunto dos Recursos Especiais nº 2.199.164/PR e 2.070.882/RS, ambos relatados pelo ministro Ricardo Villas Bôas Cueva, que a taxa SELIC é a taxa legal de juros moratórios aplicável às dívidas civis prevista no artigo 406 do Código Civil de 2002, até a entrada em vigor da Lei nº 14.905/2024. A decisão, proferida por unanimidade, foi qualificada como Tema Repetitivo nº 1368, fixando entendimento vinculante para as instâncias inferiores em todo o país.

O ponto central da controvérsia consistia em definir qual taxa de juros deveria ser utilizada nas relações civis para a contagem dos juros moratórios legais antes da recente alteração legislativa. Parte da doutrina e da jurisprudência aplicava a taxa de 1% ao mês prevista no art. 161, § 1º, do Código Tributário Nacional (CTN), enquanto outra corrente, amparada em precedentes da Primeira Seção do STJ, sustentava a aplicação da SELIC, por ser a taxa efetivamente utilizada nas relações entre contribuintes e o Fisco Federal.

A Corte Especial consolidou o entendimento de que a SELIC é o parâmetro adequado, considerando que o art. 406 do Código Civil vincula expressamente a taxa de juros civis àquela aplicável à mora no pagamento de tributos devidos à Fazenda Nacional. A decisão reafirmou, portanto, que o legislador buscou uniformizar os critérios de juros legais nas relações públicas e privadas, assegurando coerência e estabilidade macroeconômica.

Segundo o relator, a taxa SELIC — que combina juros moratórios e correção monetária em um único índice — é a única taxa atualmente em vigor para a atualização e cobrança de débitos tributários federais. Sua adoção decorre de um conjunto de normas que incluem as Leis nº 8.981/1995, 9.065/1995, 9.250/1995, 9.393/1996, 10.522/2002, e o Decreto nº 7.212/2010 (Regulamento do IPI), além de ter sido constitucionalizada pela Emenda Constitucional nº 113, que conferiu base normativa explícita para sua aplicação em todo o território nacional.

O ministro Ricardo Villas Bôas Cueva destacou que a taxa de 1% ao mês prevista no CTN tem caráter subsidiário, sendo aplicável apenas quando não existir disposição legal específica. Como há legislação expressa determinando a aplicação da SELIC aos tributos federais, o dispositivo do CTN não se aplica ao art. 406 do Código Civil. Assim, a SELIC substitui a taxa de 1% ao mês como taxa legal de mora para as relações civis, refletindo a política econômica oficial do país.

O relator afastou também a tese de que os juros moratórios teriam função punitiva. Segundo o voto, a finalidade dos juros de mora é exclusivamente compensatória, destinando-se a ressarcir o credor pelos efeitos do atraso no pagamento. A eventual função sancionatória é reservada à multa moratória contratual, prevista no art. 412 do Código Civil. Ademais, o art. 404 do Código Civil autoriza o juiz a conceder indenização suplementar se os juros legais não forem suficientes para reparar o prejuízo, o que demonstra que o legislador já prevê mecanismos específicos para compensação adicional, sem necessidade de elevar arbitrariamente a taxa de juros.

O voto condutor ressaltou ainda que fixar juros civis superiores ao padrão nacional poderia gerar distorções macroeconômicas e violar o princípio da harmonia entre as relações privadas e o regime financeiro público. “O art. 406 do Código Civil não autoriza a adoção de índices distintos dos aplicáveis à Fazenda Nacional. A unificação da taxa de mora serve à coerência sistêmica e à previsibilidade econômica”, pontuou o ministro Cueva.

A decisão também reiterou precedentes anteriores da Primeira Seção do STJ, que já haviam adotado o mesmo entendimento nos Temas 99, 112 e 113, fixando a SELIC como taxa legal referenciada no art. 406 do Código Civil. Esses julgados já vinham sendo seguidos em recursos envolvendo indenizações civis, contratos empresariais e condenações em ações de responsabilidade civil.

Para o colegiado, o reconhecimento da SELIC como taxa legal evita a cumulação de correção monetária e juros de mora, já que o índice engloba ambos os componentes em uma única fórmula de cálculo. Essa característica assegura maior transparência, simplicidade e uniformidade na aplicação prática, reduzindo o risco de duplicidade de encargos e de decisões divergentes entre tribunais estaduais e federais.

REsps nº 2.199.164/PR e nº 2.070.882/RS, Tema 1368

 

Fonte: https://tributario.com.br/a/stj-fixa-que-a-taxa-selic-e-o-indice-aplicavel-aos-juros-moratorios-civis-ate-a-lei-14-905-2024/