O Conselho Administrativo de Recursos Fiscais (CARF) decidiu manter a alíquota zero do Imposto de Renda Retido na Fonte (IRRF) sobre valores remetidos ao exterior por fundo de investimento brasileiro a investidor estrangeiro situado nos Estados Unidos, ainda que este fosse controlado por uma empresa sediada nas Ilhas Cayman. A decisão afastou a tese da Receita Federal de que haveria um planejamento tributário abusivo com interposição artificial de sociedade.
No caso analisado, o Fisco havia autuado a empresa INTRAG Distribuidora de Títulos e Valores Mobiliários LTDA, sob o argumento de que o real investidor dos rendimentos remetidos ao exterior seria uma companhia domiciliada em paraíso fiscal — nas Ilhas Cayman — e não a entidade americana formalmente identificada como cotista do fundo. Segundo a fiscalização, a estrutura teria sido usada de forma artificial para se beneficiar indevidamente da alíquota zero do IRRF, prevista para investidores estrangeiros em determinadas condições.
O entendimento da fiscalização foi construído com base na alegação de que a empresa norte-americana, embora formalmente detentora das cotas do fundo, era apenas um veículo interposto, estando sua atuação subordinada à controladora sediada em jurisdição de tributação favorecida. Com isso, o Fisco desconsiderou o investimento formalmente declarado e reclassificou a remessa como se fosse destinada à companhia nas Ilhas Cayman, aplicando a alíquota de 25% do IRRF, prevista para rendimentos remetidos a residentes em paraísos fiscais.
O contribuinte, por sua vez, sustentou a regularidade das operações estruturadas no exterior, ressaltando que os aportes no fundo foram realizados de forma lícita por entidade americana com personalidade jurídica autônoma e efetiva atividade econômica. Defendeu que não caberia à Receita Federal desconsiderar a estrutura jurídica adotada com base apenas em presunções genéricas sobre controle societário, principalmente na ausência de qualquer indício concreto de fraude, simulação ou conluio.
Ao analisar o mérito, o relator Fredy José Gomes de Albuquerque votou pelo afastamento da exigência fiscal, com base no Ato Declaratório Interpretativo nº 5/2019 da Receita Federal. De acordo com esse ato normativo, o regime especial de tributação do IRRF com alíquota zero deve considerar a jurisdição do investidor direto, exceto em casos de dolo, fraude ou simulação. No voto, destacou-se que a simples existência de uma controladora em país de tributação favorecida não descaracteriza automaticamente a legitimidade do investidor situado em país com tributação regular.
O conselheiro ressaltou que, para se admitir a desconsideração do investidor direto, seria necessário comprovar que a estrutura teria sido montada com o objetivo de simular uma operação ou ocultar o real beneficiário dos rendimentos. Citando o próprio teor do ADI nº 5/2019, afirmou que a análise deve se concentrar no investidor que efetivamente realizou o aporte de capital no Brasil, independentemente de suas relações societárias com outras empresas no exterior.
Segundo o voto vencedor, a operação realizada pela companhia americana, ainda que controlada por entidade nas Ilhas Cayman, foi conduzida de forma regular, com registro documental e estrutura jurídica válida. Destacou-se que o ordenamento jurídico nacional não veda a adoção de estruturas empresariais que, dentro da legalidade, resultem em economia tributária, desde que não haja vício de forma, vontade ou ocultação de fatos relevantes.
Além disso, foi enfatizado que a presunção de abuso por parte da fiscalização carecia de fundamento probatório, uma vez que a atuação da empresa americana como investidora direta estava respaldada por documentação e ausência de elementos que demonstrassem simulação. A decisão do colegiado reafirmou que não se presume a interposição fraudulenta e que a desconsideração de atos jurídicos exige demonstração clara de desvio de finalidade ou ocultação.
Por fim, a turma julgadora concluiu que os investimentos foram realizados de forma lícita, não havendo motivo legal para desconsiderar a autonomia da pessoa jurídica investidora. O lançamento fiscal, baseado unicamente em ilações sobre o controle societário, foi considerado ilegítimo, levando à manutenção da alíquota zero do IRRF sobre as remessas ao exterior.
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processo: 16327.720952/2021-33
Fonte: https://tributario.com.br/a/carf-reconhece-validade-de-estrutura-internacional-e-afasta-irrf-de-25-em-investimentos-via-fundo-brasileiro/