A Receita Federal consolidou entendimento favorável às entidades sem fins lucrativos, ao reconhecer que a imunidade tributária assegurada pela Constituição Federal às instituições de assistência social e de educação alcança o Imposto sobre Operações de Crédito, Câmbio e Seguros ou relativas a Títulos ou Valores Mobiliários (IOF). Esse foi o posicionamento firmado em recente Solução de Consulta, na qual a Receita aplicou a tese fixada pelo Supremo Tribunal Federal (STF) no Recurso Extraordinário nº 611.510/SP, com repercussão geral reconhecida (Tema 328), e observou o Parecer PGFN SEI nº 8643/2021/ME.
O caso analisado envolveu uma associação privada, sem fins econômicos, dedicada à promoção de assistência à saúde por meio de serviços hospitalares e ambulatoriais, com ênfase no ensino e na pesquisa. A entidade celebrou contratos com a administração pública e indagou à Receita Federal se poderia ser considerada imune ou isenta do IOF, tanto em relação a um contrato de seguro saúde destinado aos seus funcionários quanto em outras operações financeiras em geral. A dúvida central consistia em saber se a imunidade tributária prevista no art. 150, VI, “c”, da Constituição Federal de 1988, abrangeria também o IOF, especialmente nas aplicações e operações financeiras realizadas pela instituição.
A discussão está inserida no contexto do artigo 150, inciso VI, alínea “c” da Constituição, que veda à União, aos Estados, ao Distrito Federal e aos Municípios instituírem impostos sobre “o patrimônio, a renda ou os serviços dos partidos políticos, inclusive suas fundações, das entidades sindicais dos trabalhadores e das instituições de educação e de assistência social, sem fins lucrativos, atendidos os requisitos da lei”.
O regulamento do IOF, por sua vez, previsto no Decreto nº 6.306/2007, reforça esse comando ao dispor que não incide o imposto sobre “as operações realizadas por […] instituições de educação e de assistência social, sem fins lucrativos, atendidos os requisitos da lei” (art. 2º, §3º, III). Assim, tanto a norma constitucional quanto a infraconstitucional caminham no sentido de garantir a imunidade tributária para tais entidades, desde que vinculadas às suas finalidades essenciais.
A empresa argumentou que, por sua natureza e objetivos, deveria ser reconhecida como instituição de assistência social imune ao IOF. Citou o art. 199 da Constituição Federal, o art. 14 do Código Tributário Nacional e a Lei nº 9.637/1998 (que trata das organizações sociais), destacando que a imunidade tributária se estenderia às operações financeiras quando estas estivessem relacionadas às suas finalidades institucionais. Defendeu ainda que o benefício concedido aos seus funcionários por meio de seguro saúde estaria vinculado às suas atividades essenciais de promoção da saúde, justificando a aplicação da imunidade.
No exame da matéria, a Receita Federal rememorou o entendimento fixado pelo STF no RE 611.510/SP, no qual se reconheceu que “a imunidade assegurada pelo art. 150, VI, ‘c’, da Constituição da República […] alcança o IOF, inclusive o incidente sobre aplicações financeiras”. O órgão citou expressamente o Parecer PGFN SEI nº 8643/2021/ME, que consolidou o entendimento jurídico no âmbito da Fazenda Nacional, autorizando inclusive a dispensa de contestação e recurso em processos judiciais sobre a matéria. De acordo com o parecer, “a imunidade em questão abarca todas as materialidades econômicas do IOF e a vinculação da imunidade às finalidades essenciais da entidade é presumida”.
Para reforçar a coerência administrativa, a Receita também resgatou precedente interno da Solução de Consulta Cosit nº 149/2020, que reconhecera a imunidade ao IOF para instituições de educação sem fins lucrativos em operações financeiras pertinentes às suas finalidades essenciais. Nessa ocasião, o órgão esclareceu que “as instituições de educação sem fins lucrativos que atendem aos requisitos do art. 14 do CTN e do art. 12 da Lei nº 9.532/1997 gozam de imunidade do IOF […] relativamente às operações que guardem pertinência com suas finalidades essenciais”.
A Receita destacou, porém, que a aplicação da imunidade depende do correto enquadramento jurídico da entidade. Assim, a análise sobre o cumprimento dos requisitos legais — como a ausência de distribuição de lucros, a aplicação integral dos recursos em seus objetivos institucionais e a manutenção de escrituração contábil regular — é de responsabilidade do próprio contribuinte. Conforme o órgão ressaltou, “compete à entidade verificar seu correto enquadramento como instituição de assistência social para fins de obter a imunidade constitucional quanto ao IOF sobre as operações financeiras em geral”.
Com base na fundamentação apresentada, a Receita Federal concluiu que as instituições de assistência social e de educação sem fins lucrativos, desde que atendam às exigências legais, não estão sujeitas à incidência do IOF, inclusive nas aplicações financeiras. Assim, “a instituição financeira não está obrigada a reter e recolher o IOF incidente sobre as aplicações financeiras das entidades previstas no art. 150, inciso VI, alínea ‘c’, que cumprirem as condições estabelecidas por lei para o gozo da imunidade tributária”.
O entendimento consagra, portanto, a uniformização entre a jurisprudência do Supremo Tribunal Federal, o posicionamento da Procuradoria-Geral da Fazenda Nacional e a prática administrativa da Receita Federal. Com isso, conclui-se no âmbito administrativo que a imunidade constitucional dessas entidades é ampla e abrange todas as materialidades do IOF, bastando que as operações estejam vinculadas às suas finalidades essenciais.