A 2ª Turma do Superior Tribunal de Justiça (STJ) registrou um empate no julgamento que discute se a prática de subfaturamento de um serviço pode justificar a aplicação do arbitramento da base de cálculo do ISS por parte do Fisco. A decisão envolve a cobrança de R$ 350 milhões da mineradora Vale pelo município de Mangaratiba (RJ), sob o argumento de que o preço pago pelos serviços portuários prestados pela Minerações Brasileiras Reunidas (MBR) teria sido artificialmente reduzido.
O julgamento precisará ser retomado, pois o ministro Marco Aurélio Bellizze, que não fazia parte do colegiado no início da análise do caso, ainda deve proferir seu voto para desempatar a questão.
A controvérsia gira em torno do artigo 148 do Código Tributário Nacional (CTN), que permite ao Fisco arbitrar a base de cálculo de um tributo quando há omissão ou falsidade na declaração do contribuinte.
No caso concreto, a MBR prestou serviços portuários de descarga de minério de ferro e embarque para navios, cobrando R$ 0,49 por tonelada embarcada para a Vale entre 2009 e 2012. O município de Mangaratiba alegou que o valor é muito inferior aos preços praticados em outros portos, onde a Vale teria pago entre R$ 17,72 e R$ 22,38 por tonelada no mesmo período.
Além disso, a MBR é indiretamente controlada pela Vale, o que, segundo o município, justificaria o arbitramento da base de cálculo do ISS para corrigir a suposta distorção de preços.
O relator, ministro Teodoro Silva Santos, votou a favor do município, defendendo que a grande diferença de preços entre os terminais justifica a aplicação do artigo 148 do CTN. Para ele, a Vale não conseguiu comprovar que o valor pago no terminal da Ilha da Guaíba era condizente com o mercado, o que permitiria ao Fisco corrigir a base de cálculo. Ele foi acompanhado pelo ministro Afrânio Vilela.
Em sentido oposto, a ministra Maria Thereza de Assis Moura abriu a divergência, argumentando que não cabe ao STJ reanalisar provas para verificar se houve, de fato, falseamento do preço. Ela destacou que o Tribunal de Justiça do Rio de Janeiro (TJ-RJ) já decidiu favoravelmente ao contribuinte, considerando que a fixação de preços entre as partes não pode ser desconsiderada apenas com base na disparidade de valores praticados em outros portos.
O TJ-RJ entendia que o preço estabelecido entre a MBR e a Vale é uma questão de autonomia negocial e que, ainda que houvesse influência da Vale sobre a MBR, isso não justifica o arbitramento do ISS, pois a fixação de preços entre partes vinculadas não é, por si só, indício de falsidade ou omissão.
O empate no STJ indica que o julgamento poderá tomar um rumo decisivo com o voto do ministro Marco Aurélio Bellizze, que definirá se o município poderá arbitrar o ISS com base na diferença de preços ou se o entendimento do TJ-RJ será mantido.
Caso o STJ valide o arbitramento da base de cálculo, outras prefeituras podem adotar a mesma estratégia para revisar valores cobrados em operações entre empresas vinculadas, aumentando o risco de autuações fiscais em contratos similares. Por outro lado, se o tribunal mantiver o entendimento de que o subfaturamento não justifica o arbitramento do ISS, a decisão pode limitar a atuação dos fiscos municipais em casos semelhantes e reforçar a importância da autonomia privada na definição de preços. O julgamento ainda não tem nova data para ser retomado.