Por José Higídio e Mateus Mello
O Supremo Tribunal Federal reiniciará no Plenário físico o julgamento com repercussão geral sobre o teto da multa isolada pelo descumprimento de obrigações tributárias acessórias. A questão estava sendo discutida em sessão virtual, mas o ministro Cristiano Zanin pediu destaque nesta quinta-feira (22/5).
Obrigações acessórias são tarefas extras a serem cumpridas pelo contribuinte, para além do pagamento do tributo em si, de forma a auxiliar o controle feito pelo Fisco. É preciso, por exemplo, emitir notas fiscais, entregar declarações, manter registros contábeis etc.
Caso o contribuinte descumpra uma obrigação tributária acessória, fica sujeito ao pagamento de uma multa, que é chamada de isolada por não ter relação com uma eventual obrigação principal (ou seja, com o pagamento do tributo). Há casos em que sequer há obrigação principal.
No recurso extraordinário, a empresa de energia elétrica Eletronorte, subsidiária da Eletrobras na Região Amazônica, contestou uma multa isolada aplicada pelo Tribunal de Justiça de Rondônia devido ao descumprimento de uma obrigação tributária acessória.
A Eletronorte foi punida pelo governo de Rondônia por um erro no preenchimento de documentos sobre a compra de óleo diesel para geração de energia elétrica e os encargos tributários devidos. O TJ-RO manteve a multa aplicada à empresa, no patamar de 40% sobre a operação.
A porcentagem da multa era prevista por uma lei estadual, já revogada, para casos relacionados, por exemplo, ao transporte de mercadoria desacompanhada de documento fiscal. A Eletronorte alegou que a multa tem caráter confiscatório e não é razoável.
Mais tarde, a empresa pediu desistência do RE. Os ministros do STF concordaram em homologar a desistência, mas ainda assim analisaram o tema de repercussão geral.
O ministro Luís Roberto Barroso, relator do caso, chegou a pedir destaque em 2023, para reiniciar o caso em uma sessão presencial. Mas, no ano seguinte, o destaque foi cancelado.
Voto do relator
Para Barroso, a multa isolada não pode ser superior a 20% do débito tributário devido. Até o pedido de destaque, ele havia sido acompanhado pelo ministro Edson Fachin.
Barroso votou por declarar a inconstitucionalidade do trecho da lei estadual que previa a multa de 40%.
Segundo o magistrado, existe um consenso de que a multa por descumprimento de uma obrigação principal deve ser mais pesada do que a multa por descumprimento de uma obrigação acessória. Ou seja, esta última não pode exceder o limite fixado para a primeira. E a jurisprudência considera constitucional a multa de até 20% pelo atraso no cumprimento de obrigação principal.
Em um complemento ao voto, o ministro também explicou que, quando não há um tributo devido, deve-se levar em conta “o valor do tributo ou crédito potenciais”, ou seja, “o valor do tributo que poderia incidir na hipótese”. Isso pode ser um valor já recolhido em outra etapa da cadeia, um valor que ainda vai ser recolhido, o valor que seria cobrado se a operação não tivesse isenção etc.
“A análise quanto ao respeito a esse limite máximo deve ser feita como se a conduta praticada pelo sujeito passivo que é alvo da obrigação acessória determinasse, efetivamente, a incidência do tributo”, indicou Barroso. “Mesmo na ausência de tributo exigível, há interesse fiscal legítimo relacionado a um tributo ou crédito em potencial.”
Divergência
O ministro Dias Toffoli divergiu do relator. Para os casos em que há tributo ou crédito vinculado à obrigação acessória, ele votou por uma multa isolada com limite de 60% desses respectivos valores — com possibilidade de chegar a 100% caso existam circunstâncias agravantes. Já para os casos em que não há tributo ou crédito, ele considerou que a multa não pode ultrapassar 20% do valor da operação ou prestação vinculada à penalidade — mas pode chegar a 30% caso existam circunstâncias agravantes.
Ele também propôs que a multa não pode ultrapassar 1% do valor total da base de cálculo dos últimos 12 meses do tributo pertinente. Em caso de circunstância agravante, a porcentagem deve ser de 0,5% do mesmo valor.
Ainda segundo o voto divergente, na análise das circunstâncias agravantes e atenuantes, a aplicação da multa pode considerar outros parâmetros, como adequação, necessidade, justa medida, insignificância e proibição da punição dupla. O Legislativo federal, estadual ou municipal pode ponderar qual deve ser o valor adequado em cada hipótese de descumprimento.
Toffoli ainda sugeriu a modulação dos efeitos da decisão a partir da publicação da ata de julgamento, com ressalva para as ações judiciais pendentes de conclusão até a mesma data. Na sua visão, a aplicação retroativa de sua tese invalidaria muitas multas, abriria espaço para devoluções e afetaria as finanças de diversos entes.
De acordo com o magistrado, o teto de 20% proposto pelo relator “é insuficiente para reprimir ou prevenir determinadas condutas ou, ainda, induzir certos contribuintes infratores a entrar em conformidade com a lei”.
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RE 640.452
Tema 487
Fonte: https://www.conjur.com.br/2025-mai-23/stf-julgara-presencialmente-teto-para-multa-por-descumprimento-de-obrigacao-acessoria/