Por Luiza Calegari
Ministros da 2ª Seção definirão o marco final da incidência de juros remuneratórios
A 2ª Seção do Superior Tribunal de Justiça (STJ) retomou e já suspendeu novamente o julgamento sobre o marco final da incidência dos juros remuneratórios sobre os expurgos inflacionários que afetaram os investimentos na poupança de milhares de brasileiros nas décadas de 1980 e 1990.
O julgamento, que pode ter um impacto bilionário para os maiores bancos do país, tem agora dois votos a favor das instituições financeiras: do relator, ministro Raul Araújo, e da ministra Nancy Andrighi, que proferiu voto-vista na sessão desta quarta-feira, 25. O ministro Humberto Martins pediu vista; assim, ainda faltam oito votos.
O Banco do Brasil e o Bradesco são as instituições financeiras envolvidas nos dois recursos especiais que estão sendo julgados em conjunto. Eles citam provisões para os processos em seus balanços, mas não divulgam números específicos. A maioria dos grandes bancos do país menciona provisões nas demonstrações financeiras, mas sem individualizar o impacto de cada ação.
O cerne da controvérsia jurídica é a restituição aos correntistas das perdas causadas pela adoção dos sucessivos planos econômicos que tentaram, sem sucesso, controlar a inflação nas décadas de 1980 e 1990. As pessoas que tinham dinheiro investido na época não receberam a correção devida pela inflação e acabaram perdendo dinheiro. A reposição dessas perdas foi objeto de várias ações coletivas, nas quais a sentença foi favorável aos poupadores.
Agora, o STJ precisa avaliar, nos casos dos correntistas que já têm decisão favorável, até qual momento devem incidir os juros remuneratórios devidos, de 0,5%, para recomposição do patrimônio dos afetados pelas perdas. Os bancos defendem que o marco final seja o fechamento da conta ou o saque de todo o saldo da poupança, já que a partir daí nem o correntista nem o banco teriam mais nada a ganhar ou perder. Já os poupadores defendem que os juros devem incidir até o efetivo pagamento da reposição.
Votação
O relator, Raul Araújo, votou em maio a favor dos bancos, e propôs a seguinte tese: “Desde que expressamente previstos na sentença coletiva, que determina a recomposição dos índices inflacionários expurgados, o termo final de incidência dos juros remuneratórios sobre a parcela da conta poupança resultante da recomposição do índice expurgado é a data de encerramento da conta ou aquela em que passa a ter saldo zero, o que primeiro ocorrer.”
Na sessão desta quarta, Nancy Andrighi acompanhou o relator em seu voto, mantendo a proposta de tese, mas sugerindo um acréscimo. Para ela, é necessário definir que o banco será responsável por comprovar quando a conta foi zerada ou fechada, sob pena de transferir o marco final da incidência dos juros para a data da citação na ação civil pública em que a sentença favorável ao correntista foi proferida.
A ministra resumiu a questão acrescentando um segundo inciso à tese proposta pelo colega, que diria: “Cabe ao banco depositário a comprovação dessas datas, sob pena de se adotar, como termo final, a data da citação na ação civil pública que originou o cumprimento de sentença.”
Raul Araújo se manifestou a respeito desse ponto, afirmando que não caberia ao colegiado, nesse julgamento, entrar em debate sobre produção de provas. O ministro Humberto Martins, então, pediu vista.
Análise
O advogado Paulo Cavalcanti, advogado de um dos poupadores do processo, destaca a ressalva feita pela ministra de que o entendimento não se aplica às decisões que já tenham estipulado um termo final para a incidência dos juros. “A ministra procura analisar toda a questão. Mas esse ponto ficou bem enfatizado e, nos processos em que há essas decisões, ele não pode ser modificado mesmo com o julgamento desse tema”, explica.
Contexto
Os processos julgados não se enquadram na outra grande frente de discussão sobre os expurgos. Em março de 2018, o Supremo Tribunal Federal (STF) homologou um acordo entre as entidades representativas dos bancos e dos poupadores para encerramento das ações que pleiteiam a reposição, estabelecendo condições e um cronograma para a adesão dos poupadores. Em dezembro de 2022, o Supremo homologou o pedido de prorrogação do acordo por mais dois anos e meio. O andamento de todos os processos sem trânsito em julgado está suspenso até decisão colegiada da Corte sobre o tema.