Justiça afasta IRPF sobre valorização de ações em offshore

A 6ª Vara Federal de Ribeirão Preto (SP) proferiu uma das primeiras decisões contrárias à aplicação da Lei das Offshores (Lei nº 14.754/2023), afastando a incidência de Imposto de Renda da Pessoa Física (IRPF) sobre a valorização contábil de ações mantidas por meio de estruturas no exterior. O processo foi ajuizado sob nº 5007446-97.2025.4.03.6102 e teve como fundamento central a violação ao conceito constitucional de renda, já que a lei passou a exigir tributação automática anual sobre ganhos não realizados.

O investidor optara pelo regime opaco, no qual o contribuinte deve apurar, ao final de cada ano, o lucro obtido e recolher 15% de imposto, ainda que não tenha resgatado os valores. A defesa sustentou que a mera oscilação positiva no valor de mercado de ações não configura disponibilidade econômica ou jurídica, afastando assim a caracterização de renda tributável. O argumento foi acolhido pelo juiz federal substituto Jonathas Celino Paiola, que destacou que a definição contábil de “valor justo” não pode prevalecer sobre o conceito jurídico-constitucional de renda. Para ele, a tributação deve incidir somente sobre ganhos efetivamente realizados, em consonância com a Lei nº 7.713/1988, que prevê a incidência de IR apenas na alienação onerosa de ações.

Na sentença, o magistrado reforçou que o legislador não pode suprimir o requisito da realização, indispensável para a configuração de renda, e que o imposto deve refletir manifestações concretas de capacidade contributiva. Ressaltou ainda que a valorização patrimonial compulsória não representa ingresso definitivo no patrimônio do contribuinte, devendo ser afastada da base de cálculo do IRPF.

Especialistas observaram que o ponto central já havia sido objeto de intenso debate durante a tramitação da Lei nº 14.754/2023, justamente pela tentativa de tributar ganhos meramente contábeis. A advogada Thais de Laurentiis, responsável pela causa, enfatizou que a sistemática instituída pelo regime opaco não poderia alcançar “renda virtual”, que pode jamais se concretizar. Já Natalia Zimmermann, do Velloza Advogados, salientou que muitos contribuintes sequer dispõem de caixa para arcar com um imposto incidente sobre valorizações não realizadas.

A decisão contrasta com precedentes do Supremo Tribunal Federal, como no julgamento da ADI 2588, que validou a tributação sobre resultados de empresas controladas em paraísos fiscais, na data do balanço em que apurados. Em outro caso recente, a 24ª Vara Cível Federal de São Paulo negou liminar em processo nº 5035245-58.2024.4.03.6100, mantendo a exigência de IRPF sobre lucros não distribuídos.

A Procuradoria-Geral da Fazenda Nacional (PGFN) já anunciou que recorrerá, sustentando que a tributação prevista na Lei nº 14.754/2023 é plenamente legal e tem respaldo em precedentes da Justiça Federal em São Paulo. O desfecho nos tribunais superiores poderá definir os limites da aplicação da lei em relação à renda não realizada.

Processos nº 5007446-97.2025.4.03.6102 e nº 5035245-58.2024.4.03.6100

 

Fonte: https://tributario.com.br/a/justica-afasta-irpf-sobre-valorizacao-de-acoes-em-offshore/