A 1ª Seção do Superior Tribunal de Justiça (STJ) decidiu que a Fazenda Pública não pode substituir ou emendar a Certidão de Dívida Ativa (CDA) para incluir, complementar ou modificar o fundamento legal do crédito tributário. O julgamento, unânime e com efeito repetitivo, consolida tese de alcance nacional e representa uma vitória relevante para os contribuintes. A decisão impede o Fisco de corrigir o documento de cobrança e o obriga a refazer integralmente o lançamento dentro do prazo decadencial de cinco anos, sob pena de extinção do crédito.
O julgamento reuniu três recursos especiais (REsp 2.194.706, REsp 2.194.708 e REsp 2.194.734), interpostos por municípios catarinenses — Jaguaruna, Itapoá e Garopaba — contra decisões do Tribunal de Justiça de Santa Catarina (TJSC) que haviam permitido alterações em CDAs, amparadas em tese firmada no IRDR nº 24. As certidões apresentavam erros de enquadramento legal, como a indicação equivocada de ISS sob o fundamento jurídico de IPTU, o que, segundo o STJ, invalida o título executivo.
Na fundamentação, o relator ministro Gurgel de Faria afirmou que a inscrição em dívida ativa, prevista no art. 2º, § 3º, da Lei nº 6.830/1980, é ato unilateral do credor e deve conter todos os elementos exigidos pela legislação. Qualquer falha na indicação do fundamento legal compromete a certeza e a liquidez da dívida, inviabilizando a execução fiscal. O relator enfatizou que o vício não se confunde com erro formal passível de correção e fixou tese vinculante segundo a qual a Fazenda Pública “não pode, ainda que antes da sentença de embargos, substituir ou emendar a CDA para incluir, complementar ou modificar o fundamento legal do crédito tributário”.
A decisão delimita o alcance do § 8º do art. 2º da mesma lei, que autoriza emendas apenas para sanar falhas formais que não impactem a constituição do crédito, como erros de cálculo, ortografia ou inscrição, conforme já consagrado pela Súmula 392 do próprio STJ. Assim, continuam admitidas correções meramente materiais, mas permanece vedada qualquer modificação que altere a natureza ou o enquadramento jurídico da exigência tributária.
Segundo tributaristas consultados, o precedente esclarece definitivamente que a alteração da base de cálculo, da alíquota ou da fundamentação legal não se enquadra entre os erros passíveis de emenda. Advogados que atuaram no caso destacaram que a decisão reforça os princípios da legalidade e da segurança jurídica, evitando que contribuintes tenham de se defender com base em títulos viciados. A nulidade da CDA obriga a emissão de novo título apenas se ainda não transcorrido o prazo prescricional, uniformizando o entendimento em todo o país.
No caso específico de Jaguaruna, a CDA indicava apenas o Código Tributário Municipal de forma genérica, sem identificar o dispositivo legal que amparava a cobrança. O TJSC havia admitido a substituição da certidão, mas a decisão foi revertida pelo STJ, que reconheceu a nulidade do documento por ausência de fundamentação precisa. Para o advogado Matheus Scremin Santos, também envolvido na causa, o acórdão reforça a previsibilidade e a transparência das cobranças fiscais, assegurando que a CDA expresse fielmente o crédito exigido pelo Estado.
Embora os municípios ainda possam recorrer, o entendimento consolidado da 1ª Seção passa a vincular todos os tribunais do país e tende a ter maior impacto sobre administrações municipais de menor porte, que dependem de sistemas menos automatizados para a gestão da dívida ativa. Com a fixação da tese, o STJ reforça a rigidez dos requisitos formais da CDA e limita a atuação do Fisco na retificação de títulos executivos extrajudiciais.
REsp 2.194.706; REsp 2.194.708; REsp 2.194.734