Quando a pessoa morre, a dívida acaba? Entenda

Por Larissa Maia

Legislação prevê tempo de prescrição para os débitos

Após a morte de um familiar, muitas dúvidas surgem sobre burocracias envolvendo os compromissos da pessoa falecida. Um dos questionamentos entre os herdeiros é sobre quem assume as dívidas deixadas pela pessoa que falece. Afinal, existe herança de dívidas?

Segundo especialistas ouvidos pelo Valor, não há transmissão de débitos, mas há regras para que seja feito desconto de dívidas no patrimônio deixado pela pessoa falecida.

No Brasil, segundo a legislação brasileira, não há transmissão automática das dívidas aos herdeiros, ou seja, as dívidas não passam para as outras gerações da família, como filhos e netos, mas os débitos não se extinguem. Em caso de morte, as obrigações só podem ser cobrados dos herdeiros por meio da herança, se houver.

No caso de não existência de herança a partilhar, as dívidas não poderão ser cobradas dos herdeiros, explica Antonio Neto, advogado do escritório Marcos Inácio Advocacia.

Dívida afeta herança

Na partilha da herança, as dívidas podem ser deduzidas após o inventário para os herdeiros. Após feito o inventário, judicialmente ou extrajudicialmente (quando feito no cartório), são definidos os herdeiros legítimos, como a partilha será feita e a quantidade e valor dos bens do falecido, deduzindo as dívidas e as despesas de funeral.

Segundo o Artigo 796 do Código de Processo Civil, o espólio responde pelas dívidas do falecido. O espólio, explica Jorge Augusto Nascimento, sócio do escritório Domingues Sociedade de Advogados, representa o conjunto de bens, direitos e obrigações daquela determinada pessoa. “Portanto, após o falecimento, a dívida (obrigação) com o banco não acaba, devendo ser paga pelo representante da herança, o inventariante, durante a execução do processo de inventário e partilha dos bens do falecido”, explica Nascimento. A legislação está prevista no Artigo 1.997 do Código Civil.

“A legislação brasileira permite, inclusive, que o credor, nesse caso, o banco, possa realizar o requerimento ao juízo do inventário do falecido para o pagamento das dívidas que estiverem vencidas”, diz Nascimento.

Na herança, porém, somente é descontado o pagamento das dívidas no valor proporcional. Nos casos em que o valor for superior ao recebido, não há a transmissão das dívidas aos herdeiros.

Isso porque os limites da cobrança estão previstos em lei, como explica Fábio Botelho Egas, advogado especializado em Direito de Família e Sucessões do Botelho Galvão Advogados. De acordo com ele, a grosso modo, os herdeiros respondem pelas dívidas deixadas nos limites da herança. “Ou seja, se recebeu R$ 100 mil a título de herança e o falecido deixou uma dívida bancária de R$ 200 mil, a diferença de R$ 100 mil não adiantará ser reclamada do herdeiro, já que o débito extrapola o montante deixado”, diz. A regra sucessória também está prevista no Artigo 796.

Nesses casos, caberá aos herdeiros solicitarem para que seja realizado o chamado “inventário negativo”, pelo qual se reconhecerá que o valor da dívida do falecido supera o montante de bens deixados por aquele, explica Nascimento.

Em janeiro deste ano, uma decisão da 10ª Turma do Tribunal Regional Federal da 1ª Região (TRF-1) determinou a permanência da dívida de empréstimo consignado, mesmo após o falecimento do devedor. No voto, que decidiu que o contrato de empréstimo consignado não se extingue com a morte do tomador do empréstimo, o magistrado disse que o espólio ou os herdeiros são responsáveis pela dívida dentro dos limites da herança.

Neto frisa que, atualmente, “na maioria dos contratos” de financiamentos há um seguro, acoplado ao próprio contrato – como uma cláusula – no qual a dívida se extingue em caso de falecimento do contratante. Já as dívidas oriundas de contratos que não possuem seguro, continuam em vigor e integram o espólio dos herdeiros.

A dívida prescreve?

Em relação a dívida caducar ou não, Egas diz que o Código Civil prevê que cada tipo de dívida possui um período de prescrição diferente, podendo levar de 1 até 5 anos, período dentro do qual o credor terá que demandar a herança, na pessoa do inventariante, por meio de ação judicial. As regras para prescrição estão previstas nos Artigos 205 e 206 do documento.

Além disso, o Código de Defesa do Consumidor, no Art. 43 §1º também diz que credor só poderá cobrar a dívida judicialmente no prazo de cinco anos, a contar da data de vencimento da dívida e, após esse prazo, de forma extrajudicial, como por exemplo por ligações telefônicas, correspondências, dentre outros, diz Neto.

 

Fonte:

https://valor.globo.com/legislacao/noticia/2024/04/23/quando-a-pessoa-morre-a-divida-com-o-banco-acaba-entenda.ghtml