STJ – Juízo da execução fiscal é competente para decidir sobre bloqueio de valores de empresas em recuperação judicial

por Thiago Santana Lira 

 

O Superior Tribunal de Justiça – STJ, através do leading case – (CC) 196.553/PE, definiu como sendo de competência do juízo da Execução Fiscal, para decidir sobre a possibilidade bloqueio de valores em face de empresas em Recuperação Judicial.

O Ministro Relator Villas Bôas Cueva, ao analisar a norma contida no Artigo 6º, § 7-B da Lei 11.101/2005, definiu que a expressão “bem de capital” se restringe apenas aos bens corpóreos, móveis ou imóveis, não perecíveis ou consumíveis, empregados no processo produtivo da empresa.

Ou seja, a competência do juízo da Recuperação Judicial não se aplica para analisar se ativos financeiros são essenciais para “manutenção da atividade empresarial”, durante o processamento do plano recuperacional.

Ainda, o [1]Ministro definiu que “(…) assim, partindo-se da definição já assentada nesta corte, os valores em dinheiro não constituem bem de capital, de modo que não foi inaugurada a competência do juízo da recuperação prevista no artigo 6º, parágrafo 7º-B, da Lei 11.101/2005 para determinar a substituição dos atos de constrição”.

O processo de recuperação judicial é o ato que tem como principal objetivo resguardar a função social da empresa, preservação dos empregos e cumprimento de obrigações adquiridas no exercício da sua atividade, ante o estado de crise que assola os seus resultados.

Os resultados negativos podem decorrer de diversos fatores, tais como crises econômicas-financeiras em determinado setor, variação cambial, práticas políticas econômicas prejudiciais às atividades, ou até mesmo má gestão administrativa dos seus gestores.

Ademais, por expressa disposição legal, o seu processamento deverá prever de análise crítica dos demonstrativos contábeis e financeiros da empresa para avaliação dos resultados, previsão de positiva de ganhos e assim mensurar possibilidade/recuperabilidade da entidade.

Com a alteração trazida pela 14.112/2020, a Lei 11.101/2005 passou a prever de forma expressa que o [2]processamento da ação de recuperação judicial não implicará na suspensão das ações de execução fiscal.

Contudo, caberá ao juízo da recuperação judicial analisar e determinar a suspensão dos atos de constrição praticados em sede de ação de execução fiscal que recaiam sobre bens de capital essenciais à manutenção da atividade empresarial, bem como, o cumprimento do plano recuperacional, mediante cooperação jurisdicional entre os juízos

Ou seja, ainda que a cobrança judicial tramite em paralelo ao plano de recuperação judicial, a apreciação de atos de constrição sobre o seu patrimônio deve prever de análise do juízo recuperacional por competência exclusiva expressa em lei, em proteção aos demais credores.

Isto porque, ainda que se considere que o crédito tributário não se sujeite ao concurso de credores, a manutenção das constrições judiciais em sede de execução fiscal prejudica o andamento do plano recuperacional em detrimento aos demais interessados, inclusive aos da seara trabalhistas, em total dissonância ao artigo [3]186 do Código Tributário Nacional.

A norma contida no artigo 186 do Código Tributário Nacional determina que os créditos de natureza trabalhista preferem aos de natureza tributária, tão logo, permitir que as ações de execução fiscal atinjam o patrimônio da empresa em recuperação judicial prejudica não só a função social da empresa, como o pagamento de verbas de natureza alimentar aos empregados da entidade que aderiram ao plano recuperacional.

Ou seja, os ativos financeiros são bens primordiais para o andamento empresarial da entidade, bem como, pagamento das suas obrigações assumidas no plano recuperacional, e a autorização de bloqueio em ações de execução fiscal inviabiliza a sua função social.

A decisão do STJ não analisa de forma técnica tais pontos destacados, pois a interpretação de que um ativo financeiro não é essencial para empresa é minimamente contraditório com todo o objetivo traçado pelo Poder Judiciário na concessão da recuperação judicial, que se pauta em análise multidisciplinar para aplicação do instituto.

Além disto, a decisão viola expressamente a competência exclusiva do juízo da recuperação judicial prevista em legislação especial da matéria, bem como, não observa o princípio da cooperação jurisdicional previsto no artigo 6º, § 7º-B – Lei 11.101/2005.

Não cabe ao STJ a interpretação do termo “bem de capital” previsto na norma para afastar a competência exclusiva do juízo da recuperação judicial, sob pena de expressa violação ao dispositivo legal, que prevê a aplicação do princípio da cooperação jurisdicional entre as esferas para manutenção, ou não, do bloqueio realizado e viabilizar a função social da empresa.

 

Fonte: https://tributario.com.br/thlira88/stj-juizo-da-execucao-fiscal-e-competente-para-decidir-sobre-bloqueio-de-valores-de-empresas-em-recuperacao-judicial/