Uma decisão do Superior Tribunal de Justiça (STJ) está provocando forte apreensão entre empresas e tributaristas. A mudança de entendimento sobre os prazos para a compensação de créditos reconhecidos judicialmente pode significar perdas bilionárias, além de impor novas estratégias de planejamento tributário. A dúvida que fica é, afinal, o contribuinte que vence na Justiça terá, de fato, condições de aproveitar integralmente o crédito obtido?
O debate ganhou força após o julgamento do Recurso Especial nº 2.178.201/RJ, no qual a 2ª Turma do STJ fixou que todas as declarações de compensação (PER/DCOMP) devem ser transmitidas em até cinco anos contados do trânsito em julgado. A decisão rompe com a jurisprudência até então consolidada e gera um cenário de corrida contra o tempo para que empresas não percam valores expressivos reconhecidos em juízo.
Segundo Ana Flávia Cunha e Lucas Querido, a decisão da 2ª Turma representa uma verdadeira ruptura com o entendimento anterior, que permitia a utilização dos créditos até o seu esgotamento, desde que o pedido de habilitação tivesse sido apresentado no prazo de cinco anos. Agora, os contribuintes que não conseguirem transmitir todas as PER/DCOMP nesse intervalo correm o risco de ver seus créditos perecerem. Para os autores, essa guinada jurisprudencial transforma a compensação em uma corrida contra o relógio, marcada por riscos de prescrição parcial ou total.
Embora a medida não seja vinculante, o alinhamento da 2ª Turma à 1ª Turma do STJ – já inclinada a essa interpretação em julgados como os Recursos Especiais nº 1.729.860/SC, 2.164.744/SP e 2.105.426/SC – sinaliza uma tendência de consolidação. Em um cenário já adverso aos contribuintes, que enfrentam modulações de efeitos restritivas e a perda de eficácia de decisões transitadas em julgado diante de novos precedentes do STF, a decisão reforça a sensação de instabilidade. Os advogados apontam que o contribuinte, mesmo vitorioso, pode acabar sem usufruir plenamente do direito reconhecido.
Para Vitor Fantaguci Benvenuti, a mudança no entendimento da 2ª Turma foi construída sobre uma premissa equivocada. O autor explica que o precedente da 1ª Turma do STJ citado como fundamento – o REsp 1.729.860/SC – não representava uma guinada jurisprudencial, mas sim um caso concreto em que o contribuinte interpretou de forma incorreta o efeito da habilitação do crédito como causa de interrupção, e não de suspensão, do prazo prescricional. Assim, o insucesso na compensação se deu por questões específicas de contagem do prazo, e não por uma orientação contrária aos contribuintes.
Na avaliação de Benvenuti, a decisão da 2ª Turma no REsp 2.178.201/RJ representa, de fato, uma mudança de jurisprudência e coloca em xeque a segurança jurídica. Ele alerta que, se mantida, a interpretação pode levar à perda de saldos remanescentes de créditos de forma indevida, especialmente quando o contribuinte não dispõe de débitos suficientes para consumir integralmente o valor reconhecido judicialmente.
Por isso a questão deve ser levada à 1ª Seção do STJ, responsável por uniformizar os entendimentos das duas Turmas, com a expectativa de que o posicionamento seja revisto.
Nesse contexto, as análises convergem no diagnóstico de que a nova interpretação do STJ traz insegurança significativa para os contribuintes. Ela traz efeitos práticos imediatos, que transformam a compensação em uma corrida contra o tempo e reduzem a efetividade das vitórias judiciais, considerando que a mudança se baseou em premissas equivocadas e, por isso, carece de revisão institucional.
A principal consequência desse cenário é a fragilização da confiança nas decisões judiciais transitadas em julgado. O contribuinte, que já enfrenta a morosidade da administração tributária e a dificuldade de planejar com segurança o aproveitamento de créditos, vê-se diante da necessidade de reavaliar rapidamente estratégias, sob pena de perder valores expressivos reconhecidos judicialmente.
Resta agora acompanhar a possível uniformização do entendimento pela 1ª Seção do STJ. A depender do resultado, o tribunal poderá reafirmar a lógica histórica de aproveitamento integral dos créditos até seu exaurimento ou consolidar uma limitação temporal que, na prática, reduz o alcance do direito à repetição do indébito tributário. Até lá, o que prevalece é um ambiente de incerteza, em que a vitória judicial não garante, necessariamente, o efetivo benefício econômico.