Foi obtida na última sexta-feira (6/3) pela Associação Brasileira de Eventos (Abrafesta) uma decisão no Tribunal Regional Federal da 3ª Região (TRF3) para suspender os efeitos da norma do Ministério da Economia que reduziu o número de setores com direito às alíquotas zero previstas no Programa Emergencial de Retomada do Setor de Eventos (Perse).
O recorte foi realizado através da Portaria ME 11.266/2022, editada em dezembro.Por intermédio dela, foram excluídos 50 setores do benefício de aplicação da alíquota zero do IRPJ, CSLL, PIS e Cofins pelo prazo de 60 meses, previsto na Lei nº 14.148/2021, que instituiu o Perse.
Pouco mais de um ano antes, o mesmo governo havia publicado a Portaria ME 7.163/2021, com 88 setores contemplados. “A mudança de regra no meio do jogo”, como colocou Lucas Corsino de Paiva, sócio BBMM e que atuou no processo da Abrafesta, “pegou todo mundo de surpresa”.
A referida norma foi editada em dezembro,porém publicada apenas no primeiro dia útil deste ano, em 2 de janeiro, na sequência da MP 1147/2022. Foi estabelecido por esta medida provisória, que o benefício fiscal deverá se basear no resultado auferido pelas pessoas jurídicas cujas atividades estão relacionadas em ato do Ministério da Economia.
Conforme o advogado, além de a revisão ter partido da mesma administração que havia listado os setores, surpreendeu o fato de ser “difícil de achar algum critério, alguma lógica” na restrição. Segmentos ligados indiretamente ao setor de eventos continuaram a ser contemplados, como o de filmagem de festas, enquanto outros, como de fornecimento de alimentos e serviços de buffet, não.
A Abrafesta entrou com um mandado de segurança coletivo na Justiça Federal de São Paulo, alegando que a mudança causaria danos às empresas que já tinham se preparado para receber o benefício, e solicitou uma liminar a fim de reincluir as atividades excluídas.
Inicialmente, o pedido foi negado pelo juízo de primeiro grau, o que levou a entidade a recorrer ao TRF3. Na segunda instância, a desembargadora federal Mônica Autran Machado Nobre, da 4ª Turma, acolheu o recurso.
Nobre considerou que o governo pode instituir ou elevar tributos via medida provisória. O problema está em revogar uma isenção concedida por “prazo certo e sob determinadas condições”, em afronta ao disposto no artigo 178 do Código Tributário Nacional (CTN). O dispositivo define que “a isenção, salvo se concedida por prazo certo e em função de determinadas condições, pode ser revogada ou modificada por lei, a qualquer tempo”.
A magistrada citou uma decisão do desembargador federal Marcelo Saraiva, do último dia 17 de fevereiro, no mesmo sentido. O desembargador apreciou o pedido da GRSA, que requereu em mandado de segurança coletivo o afastamento da Portaria nº 11.266/22 e a suspensão da exigibilidade dos tributos para cinco setores nos quais atua:
- Fornecimento de alimentos para empresas;
- Aluguel de máquinas e equipamentos;
- Pensões (alojamento);
- Serviços para apoio a edifícios;
- Instalação de portas, janelas, tetos, divisórios e armários.
Segundo Saraiva, a exclusão de atividades do benefício do Perse “rompeu com a expectativa normativa criada pelo próprio Poder Público”, contrariando, “em tese, a segurança jurídica, a boa-fé do contribuinte, a lealdade da Administração Pública, a proteção da confiança legítima e o direito adquirido da Agravante”.
Saraiva concedeu a tutela e afastou os efeitos da portaria para o grupo de empresas. A decisão foi dada no processo de número 5002656-14.2023.4.03.0000.
A desembargadora Mônica Nobre reconheceu, dessa forma, haver razões para que a decisão de primeira instância fosse reformada, com risco de cobrança indevida, inclusive com inscrição de valores em dívida ativa, e deferiu a tutela antecipada.
O advogado Lucas Corsino de Paiva argumentou que o entendimento é relevante porque as empresas se adequaram para poder usufruir dos benefícios do Perse. “A adequação foi realmente muito importante no setor de eventos porque a maioria não é de porte de Lucro Real. São empresas menores. É um mercado muito mais pulverizado. Muitas contavam com esse benefício na hora de fazer a adoção do regime tributário no início deste ano.”
De acordo com Paiva, a decisão “acende um alerta para o governo federal do quanto a nova portaria foi irrazoável”.
A discussão sobre o Perse também segue na Receita Federal, que publicou as soluções de consulta 51 e 52 nesta segunda-feira (6/3) confirmando as restrições aos benefícios fiscais do programa previstas na Instrução Normativa (IN) 2.114/2022.
A Instrução Normativa traz como um dos principais pontos a restrição à aplicação das alíquotas zero de IRPJ, CSLL, PIS e Cofins prevista no Perse apenas para receitas e resultados operacionais relacionados a eventos sociais, culturais e serviços turísticos.
A IN, por exemplo,estabelece que o benefício fiscal não se aplica às receitas classificadas como financeiras ou de resultados não operacionais.
Desta maneira, na Solução de Consulta (SC) 52, a previsão é de que as receitas e resultados auferidos pela empresa em decorrência “da prestação de serviços de limpeza e conservação para terceiros, bem como da terceirização de mão de obra, não se sujeitam ao benefício fiscal”.
Para a especialista em Direito Tributário no escritório Chediak Advogados, Maria Eduarda Staloch, a Solução de Consulta acaba validando a Instrução Normativa de novembro. “Por mais que exista a discussão sobre esta IN extrapolar seu poder de regulamentar, a Solução de Consulta acaba vinculando a RFB, que deverá autuar as empresas que não se adequarem conforme o disposto na IN”, disse.
O debate a respeito de uma possível extrapolação da IN ao regulamentar a Lei 14.148/2021, que instituiu o Perse, vem acontecendo desde o ano passado, e ao menos dois juízes afastaram as restrições previstas na Instrução Normativa.
No processo 5062734-21.2022.4.04.7100, o juiz Ricardo Nüske, da 13ª Vara Federal de Porto Alegre, entendeu que a Instrução Normativa limitou indevidamente a extensão do benefício fiscal do Perse. A decisão é de dezembro de 2022.
Também no último mês de 2022, o juiz Marcus Lívio Gomes, da 12ª Vara Federal do Rio de Janeiro, decidiu que não era possível fazer a restrição pela Instrução Normativa porque a lei não havia ressalvado qualquer tipo de receita.
A mesma SC ainda reforça que empresas enquadradas no Simples Nacional não podem fazer parte do programa. Esclarece, porém, que se a empresa foi posteriormente excluída do Simples, pode ser abrangida pelo Perse.
Por outro lado, a Solução de Consulta 51 é mais simples, na avaliação de Maurício Pereira Cabral, do Blasi & Valduga Advogados Associados. O normativo estabelece que o benefício fiscal se aplicará às receitas do período entre março de 2022, quando houve a promulgação da parte do texto que havia sido vetada pela Presidência, até fevereiro de 2027, completando os 60 meses previstos na Lei. “Penso que em relação à primeira solução [51] não há controvérsia. A data inicial é a da publicação do veto e não da lei”, apontou (Com informações do Jota)
O processo tramita sob o número 5003946-64.2023.4.03.0000.
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