Os fundos de investimento imobiliário (FIIs) obtiveram uma vitória relevante no Conselho Administrativo de Recursos Fiscais (Carf). A 1ª Turma da 1ª Câmara da 1ª Seção decidiu, por unanimidade, que os beneficiários de um FII podem ser, ao mesmo tempo, controladores de empreendimentos imobiliários sem que isso implique na equiparação automática do fundo a uma pessoa jurídica. Com esse entendimento, afasta-se a cobrança de Imposto de Renda (IRPJ), Contribuição Social sobre o Lucro Líquido (CSLL), PIS e COFINS, representando um importante precedente para o setor.
O julgamento envolveu dois fundos de investimento que exploram o Shopping Parque Dom Pedro, localizado em Campinas (SP). A fiscalização da Receita Federal resultou em uma autuação fiscal que ultrapassa R$ 400 milhões, incluindo juros de mora e multa de ofício de 75%. A base da autuação foi uma representação feita pela Comissão de Valores Mobiliários (CVM), que apontou possível irregularidade no fato de cotistas deterem mais de 25% das cotas dos fundos.
Para a Receita, a Aliansce Sonae — atualmente Allos — controlaria a Sierra Investimentos, que é uma das cotistas do fundo e também sócia do empreendimento imobiliário. Na visão do Fisco, essa configuração demonstraria uma participação indireta da Aliansce Sonae no fundo, o que atrairia a aplicação do artigo 2º da Lei nº 9.779/1999. Essa norma determina que, quando uma pessoa física ou jurídica detém mais de 25% das cotas de um FII, ele pode ser equiparado a uma pessoa jurídica, sendo, assim, obrigado a recolher IRPJ, CSLL, PIS e COFINS.
O relator do caso, conselheiro Efigênio de Freitas Júnior, divergiu da interpretação adotada pela Receita Federal. Ele destacou que a Aliansce Sonae não é cotista do fundo diretamente, mas participa do empreendimento indiretamente por meio da controladora Sierra Investimentos. Para o relator, o conceito de “cotista” estabelecido no artigo 2º da Lei nº 9.779/1999 exige uma participação direta no fundo, o que não ocorre no caso em análise.
O conselheiro afirmou que, para que se configure a equiparação de um FII a uma pessoa jurídica, é indispensável que a participação acionária seja direta e não indireta. O simples fato de uma empresa ser controladora de outra que, por sua vez, é cotista do fundo não é suficiente para atrair a incidência da norma. Além disso, Freitas Júnior destacou que a legislação não referir-se a participações indiretas, e a aplicação dessa lógica sem previsão legal clara violaria o princípio da legalidade tributária.
Outro ponto de destaque no voto foi a ausência de comprovação de dolo, fraude ou simulação nas operações realizadas. Consoante o relator, apenas a existência de práticas fraudulentas poderia justificar a aplicação do dispositivo legal para equiparar o FII a uma pessoa jurídica.
O entendimento do relator foi acompanhado de forma unânime pelos demais conselheiros da 1ª Turma. Essa unanimidade tem peso relevante, já que indica um consenso entre os julgadores em relação à interpretação da norma. A decisão representa um importante precedente para os fundos de investimento imobiliário, pois a tese de equiparação a pessoa jurídica vinha sendo utilizada de forma recorrente pela Receita Federal em autuações de grande valor.
A decisão também reforça a tese de que o conceito de “cotista” contido na Lei nº 9.779/1999 exige participação direta e efetiva no fundo. Isso afasta a possibilidade de o Fisco presumir a participação indireta como suficiente para configurar a condição de sócio ou cotista, protegendo as operações de reestruturação e controle empresarial, especialmente no setor de empreendimentos imobiliários.
processo nº 16327.720170/2023-6