ENTENDA POR QUE O CONTRATO DE TRANSPORTE DE CARGAS NÃO É TERCEIRIZAÇÃO, SEGUNDO O TST

Por Bruna Mikele Lopes de Souza Thomasi

O setor de transporte de cargas, vital para a economia do país, recebeu um importante reforço em sua segurança jurídica. O Tribunal Superior do Trabalho (TST) consolidou o entendimento de que a contratação de serviços de transporte de mercadorias não se confunde com a terceirização de mão de obra, afastando, assim, a aplicação da Súmula nº 331, inciso IV, da Corte. Essa decisão, firmada em 24 de fevereiro de 2025, por meio do julgamento do Tema Repetitivo 59 (Processo: RRAg-0025331-72.2023.5.24.0005), esclarece um ponto crucial para empresas e transportadores, evitando responsabilizações indevidas e promovendo maior clareza nas relações comerciais.

No transporte, o foco principal é o resultado: a entrega da mercadoria em perfeito estado no destino, dentro do prazo acordado. Trata-se de um negócio jurídico de natureza comercial, regulado pelo Código Civil (artigos 730 a 756) e, especificamente para o transporte rodoviário, pela Lei nº 11.442/2007. Essa legislação específica reforça a autonomia do transportador, seja ele uma pessoa jurídica (Empresa de Transporte Rodoviário de Cargas – ETC) ou um profissional autônomo (Transportador Autônomo de Cargas – TAC). Eles atuam com independência, assumindo os riscos de sua atividade econômica. A relação entre o embarcador (quem contrata o transporte) e o transportador é estritamente comercial, pautada por princípios do direito civil e comercial, e não por laços de subordinação típicos de uma relação de emprego.

A Súmula nº 331, inciso IV, do TST foi criada para proteger trabalhadores em casos de terceirização ilícita, onde uma empresa contrata outra para fornecer mão de obra, mas a relação disfarça um vínculo empregatício direto.

A razão é simples: o contrato de transporte não envolve a mera disponibilização de mão de obra. O transportador não está cedendo seus empregados para trabalhar sob as ordens do embarcador, mas sim prestando um serviço especializado de movimentação de bens. A responsabilidade do embarcador se limita ao pagamento do frete e ao cumprimento das obrigações comerciais do contrato, sem que haja qualquer vínculo trabalhista com os motoristas ou funcionários do transportador.

A decisão do TST, ao consolidar o Tema Repetitivo 59, traz um alívio para as empresas que dependem do transporte de cargas. Ao reconhecer a natureza comercial e autônoma dessa atividade, a Corte afasta a possibilidade de responsabilização subsidiária dos embarcadores por dívidas trabalhistas dos transportadores. Isso significa menos riscos jurídicos e maior previsibilidade para o setor logístico, incentivando investimentos e a formalização das relações. É importante ressaltar que essa decisão não desprotege o trabalhador. Os direitos trabalhistas devem ser buscados diretamente contra o empregador (a empresa de transporte ou o transportador autônomo), que é o responsável legal por essas obrigações. A clareza trazida pelo TST apenas delimita as responsabilidades de cada parte, garantindo que o direito seja aplicado de forma justa e coerente com a realidade das relações comerciais.

A distinção entre o contrato de transporte de cargas e a terceirização de serviços é um avanço significativo para a segurança jurídica no Brasil. A jurisprudência do TST, ao afastar a aplicação da Súmula nº 331, inciso IV, aos contratos de transporte, reconhece a especificidade e a autonomia dessa atividade essencial. Essa compreensão é fundamental para evitar interpretações equivocadas da lei e assegurar que as empresas que contratam serviços de transporte não sejam indevidamente oneradas por responsabilidades que não lhes cabem. A decisão, portanto, fortalece o contrato de transporte e contribui para a estabilidade e o desenvolvimento do setor logístico no país.

 

Referências

[1] BRASIL. Tribunal Superior do Trabalho. Processo: RRAg-0025331-72.2023.5.24.0005.

[2] BRASIL. Tribunal Superior do Trabalho. Súmula nº 331. Disponível em: https://www.tst.jus.br/sumulas-e-orientacoes-jurisprudenciais/-/asset_publisher/89Dk/content/sumula-n-331-contrato-de-prestacao-de-servicos-legalidade?inheritRedirect=false&redirect=https%3A%2F%2Fwww.tst.jus.br%2Fsumulas-e-orientacoes-jurisprudenciais%3Fp_p_id%3D101_INSTANCE_89Dk%26p_p_lifecycle%3D0%26p_p_state%3Dnormal%26p_p_mode%3Dview%26p_p_col_id%3Dcolumn-2%26p_p_col_count%3D1.

[3] BRASIL. Lei nº 10.406, de 10 de janeiro de 2002. Código Civil. Disponível em: http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/leis/2002/l10406.htm.

[4] BRASIL. Lei nº 11.442, de 5 de janeiro de 2007. Dispõe sobre o transporte rodoviário de cargas por conta de terceiros e mediante remuneração e dá outras providências. Disponível em: http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/_ato2007-2010/2007/lei/l11442.htm.