A Lei 14.873/2024 trouxe modificações relevantes à sistemática da compensação tributária no Brasil, com especial impacto sobre os créditos oriundos de decisões judiciais transitadas em julgado. As alterações, inseridas principalmente por meio do novo artigo 74-A da Lei 9.430/1996, criaram uma limitação escalonada ao uso desses créditos, condicionando sua utilização a um limite mensal proporcional ao valor total reconhecido judicialmente.
A medida afeta diretamente empresas com altos volumes de crédito tributário e abre margem para novas discussões jurídicas sobre a materialização da disponibilidade da renda tributável e a segurança jurídica do contribuinte.
Essas alterações normativas têm gerado controvérsias tanto no plano prático-operacional quanto jurídico, uma vez que restringem o direito dos contribuintes à livre utilização de seus créditos reconhecidos, interferindo no fluxo de caixa e na previsibilidade da recuperação de valores pagos indevidamente. Os impactos são ainda mais sensíveis para empresas que planejam o uso desses créditos como forma de equilíbrio financeiro, gerando reações negativas no meio empresarial e mobilizando o contencioso tributário.
De acordo com Tiago Moreira Vieira Rocha, José Arnaldo Godoy Costa de Paula e Lucas Valle Martins, a introdução de limites mensais para a compensação de créditos tributários superiores a R$ 10 milhões interfere diretamente no conceito de disponibilidade jurídica da renda, base para a incidência do IRPJ e da CSLL conforme o artigo 43 do CTN. Os autores argumentam que, ao limitar legalmente o uso imediato do crédito reconhecido, a nova legislação retarda o momento em que tal crédito se torna efetivamente disponível, e, portanto, tributável.
Essa interpretação sustenta que a tributação deveria ocorrer proporcionalmente à efetivação da compensação via DCOMP, e não a partir do reconhecimento contábil ou da entrega da primeira declaração. Em reforço, citam decisões como a SC SRRF 206/2003 e a recente Portaria MF 14/2024 para embasar a tese da tributação parcelada segundo a concretização do direito creditório.
Na avaliação de Júlio N. Nogueira, a nova regra marca uma mudança significativa ao estabelecer um limite temporal e quantitativo à compensação de créditos oriundos de decisões judiciais. Para o autor, a Lei 14.873/2024 busca proteger a arrecadação fiscal ao postergar o impacto orçamentário da utilização desses créditos. Embora a nova regra apenas exija a apresentação da primeira DCOMP em até cinco anos do trânsito em julgado, o fracionamento compulsório pode afetar negativamente empresas com créditos vultosos.
Nogueira aponta que, apesar de juridicamente válida, a norma desperta preocupação quanto à sua constitucionalidade e ao possível conflito com direitos adquiridos. Também adverte que essa medida pode ser prenúncio de futuras restrições sobre créditos de PIS e COFINS, especialmente durante o período de transição da reforma tributária.
Maria Andréia dos Santos destaca um problema prático emergente: a sistemática da Receita Federal tem indeferido compensações mesmo quando ainda dentro do prazo legal, desconsiderando o tempo entre o protocolo do pedido de habilitação do crédito e a sua aprovação. A articulista relata que contribuintes estão sendo surpreendidos com mensagens de prescrição no sistema PER/DCOMP, impedindo a realização das compensações.
Esse bloqueio tem motivado judicializações para garantir o direito à compensação, sobretudo após o não reconhecimento de compensações relacionadas ao PIS e à COFINS no fim de junho. Segundo a autora, essa postura da Receita representa mais um obstáculo operacional aos direitos do contribuinte, e pode comprometer o planejamento tributário de empresas, especialmente aquelas com menor capacidade de pagamento imediato.
Assim, o contexto da Lei ainda revela um cenário de tensão entre a preservação da arrecadação estatal e os direitos creditórios dos contribuintes. A Lei 14.873/2024, ao estabelecer limites legais à compensação de créditos, ressignifica o momento da disponibilidade jurídica da renda, impactando diretamente a tributação pelo IRPJ e pela CSLL.
Ainda que a norma se fundamente em critérios de razoabilidade fiscal, sua aplicação tem gerado incertezas jurídicas e operacionais que exigem atuação estratégica dos contribuintes e atenção constante aos desdobramentos jurisprudenciais.