Por José Homero Adabo
O projeto de lei complementar PLP nº 108/2024, tal como aprovado pela Câmara dos Deputados, no último dia 13/08, amplia de forma importante a base de contribuintes do ITCMD, porém sem qualquer previsão de redução da alíquota. Muito ao contrário, vozes importantes de autoridades econômicas, incluindo o Presidente da República, falam em aumento da alíquota, utilizando-se como paradigma a tributação americana sobre herança.
Neste artigo, vamos estabelecer uma comparação entre a legislação atual do ITCMD vigente no Estado de São Paulo e aquela disposta no PLP nº 108/2024, aprovado pela Câmara Federal, com destaque para várias questões práticas decorrentes. É importante registrar que não são poucas as falas sobre a ampliação da base de contribuintes do imposto, o que nos leva a crer que o interesse das autoridades econômicas seja mesmo o aumento de arrecadação tributária, já que existe, de forma muito velada, uma aparente aceitação de elevação da arrecadação do ITCMD, com a justificativa de tratar do imposto sobre herança, que sempre remete ao imaginário popular de famílias abastadas e, por isso, devem sofrer maior tributação. Do ponto de vista político, também é muito fácil a sua aprovação, já que não contém nenhum apelo popular que possa barrar um aumento da carga tributária, como ocorre com outros impostos.
No entanto, é preciso considerar que este imposto não incide somente sobre a herança transmitida, mas sobre um número bem maior de novas hipóteses, consideradas pelo projeto de lei, como doação.
Pedimos licença ao leitor para apresentar nos quadros abaixo o comparativo entre a legislação atual vigente no Estado de São Paulo (Lei nº 10.705/2000) e o disposto no PLP nº 108/2024 aprovado pela Câmara e agora em discussão no Senado. Havendo modificações pela passagem no Senado, o projeto retorna à Câmara para apreciação final. Se houver esta nova aprovação pela Câmara, o projeto será levado à sanção do Presidente da República para assim se tornar lei. Por isso, é possível que o ITCMD entre em vigor já a partir de 01.01.2026, uma vez que exige apenas uma adaptação de lei ordinária pelos Estados e Distrito Federal, sem a necessidade de seguir qualquer fase de transição, como ocorre com o IBS e a CBS.
Portanto, estamos muito próximos de uma alteração substancial do ITCMD, não só em relação à elevação de alíquotas e implantação da progressividade obrigatória, que também está prestes a ser aprovada pela Assembleia Legislativa de São Paulo [1], mas pela ampliação da base de contribuintes trazida pelo projeto de lei complementar, como veremos na sequência.
Destacamos no quadro 1 abaixo a transcrição da lei paulista em vigor e o que consta do PLP nº 108/2024, relativamente ao fato gerador do ITCMD.
Quadro 1. Incidência do fato gerador do ITCMD
Lei Paulista nº 10.705/2000 | PLP nº 108/2024 aprovado pela Câmara Federal em 13/08/2024 |
Artigo 2º – O imposto incide sobre a transmissão de qualquer bem ou direito havido:
I – por sucessão legítima ou testamentária, inclusive a sucessão provisória; II – por doação. § 1º – Nas transmissões referidas neste artigo, ocorrem tantos fatos geradores distintos quantos forem os herdeiros, legatários ou donatários. (…) § 5º – Estão compreendidos na incidência do imposto os bens que, na divisão de patrimônio comum, na partilha ou adjudicação, forem atribuídos a um dos cônjuges, a um dos conviventes, ou a qualquer herdeiro, acima da respectiva meação ou quinhão. (…)
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Art. 160. O ITCMD incide sobre a transmissão de quaisquer bens ou direitos:
I – em razão da ocorrência do óbito do seu titular; ou II – por doação. § 1º O ITCMD incide sobre: I – a transmissão de quaisquer bens e direitos para os quais se possa atribuir valor econômico; II – aportes financeiros capitalizados sob a forma de planos de previdência privada ou qualquer outra forma ou denominação de aplicação financeira ou investimento, seja qual for a modalidade de garantia. (…) § 4º Consideram-se também como doação, para fins da incidência do ITCMD, as demais transmissões de bens e direitos a título gratuito, tais como: I – o ato de que resulte excesso de meação ou de quinhão, assim caracterizada a divisão de patrimônio comum, na partilha ou na adjudicação, em que for atribuído a um dos cônjuges, a um dos companheiros, ou a qualquer herdeiro, patrimônio superior à fração ideal a qual fazem jus, conforme determinado pela lei civil; e II – a transferência a título gratuito, pelo usufrutuário, para o nu proprietário, de frutos não usufruídos. |
Estamos diante da primeira ampliação da base de contribuintes. Sendo possível atribuir valor econômico na transmissão do bem ou direito, já é o suficiente para determinar a incidência do ITCMD. É o que se depreende da leitura no Quadro 1 acima do Art. 160, § 1º, inciso I, do PLP nº 108/2024, comparado com o Art. 2º da Lei Paulista nº 10.705/2000.
O excesso de meação ou do quinhão (Art. 160, § 4º, inciso I, do PLP nº 108/2024), nos casos em que se mencionam, está mantido em ambas as legislações, mas foi acrescentado que, na transferência a título gratuito pelo usufrutuário ao nu proprietário dos frutos não usufruídos também incide o ITCMD, por ser considerado uma doação, situação não prevista atualmente na legislação de São Paulo. É o caso por ex. de pai que doou aos filhos quotas de uma sociedade limitada e reservou para si o usufruto dessas mesmas quotas. Mas, tempos depois, por qualquer razão passada desapercebida, permitiu que os filhos recebessem parte dos lucros apurados nos períodos de competência da vigência desta reserva de usufruto. Pois bem, agora, os lucros recebidos pelos filhos, nesta condição, passam a sofrer a incidência do ITCMD.
Outra ampliação da base de contribuintes sujeitos ao ITCMD consta do parágrafo 5º, incisos I, II e III, do Art. 160 do projeto de lei complementar aprovado pela Câmara, disposto no Quadro 2 abaixo.
Quadro 2. Qualificação do fato gerador adicional do ITCMD
Lei Paulista nº 10.705/2000 | PLP nº 108/2024 aprovado pela Câmara Federal em 13/08/2024 |
(…)
Artigo 3º – Também sujeita-se ao imposto a transmissão de: I – qualquer título ou direito representativo do patrimônio ou capital de sociedade e companhia, tais como ação, quota, quinhão, participação civil ou comercial, nacional ou estrangeira, bem como, direito societário, debênture, dividendo e crédito de qualquer natureza; II – dinheiro, haver monetário em moeda nacional ou estrangeira e título que o represente, depósito bancário e crédito em conta corrente, depósito em caderneta de poupança e a prazo fixo, quota ou participação em fundo mútuo de ações, de renda fixa, de curto prazo, e qualquer outra aplicação financeira e de risco, seja qual for o prazo e a forma de garantia; III – bem incorpóreo em geral, inclusive título e crédito que o represente, qualquer direito ou ação que tenha de ser exercido e direitos autorais. (…) Artigo 4º – O imposto é devido nas hipóteses abaixo especificadas, sempre que o doador residir ou tiver domicílio no exterior, e, no caso de morte, se o “de cujus” possuía bens, era residente ou teve seu inventário processado fora do país: I – sendo corpóreo o bem transmitido: a) quando se encontrar no território do Estado; b) quando se encontrar no exterior e o herdeiro, legatário ou donatário tiver domicílio neste Estado; II – sendo incorpóreo o bem transmitido: a) quando o ato de sua transferência ou liquidação ocorrer neste Estado; b) quando o ato referido na alínea anterior ocorrer no exterior e o herdeiro, legatário ou donatário tiver domicílio neste Estado. |
Art. 160. O ITCMD incide sobre a transmissão de quaisquer bens ou direitos:
(…) § 3º Considera-se como doação, para fins da incidência do ITCMD, o ato pelo qual uma pessoa, por liberalidade, transfere do seu patrimônio bens ou direitos para o de outra, que os aceita, expressa, tácita ou presumidamente, com ou sem encargo. (…) § 5º Consideram-se, ainda, como doações, para fins da incidência do ITCMD, em transmissões entre pessoas vinculadas: I – os atos societários que resultem em benefícios desproporcionais para sócio ou acionista praticados por liberalidade e sem justificativa negocial passível de comprovação, incluindo distribuição desproporcional de dividendos, cisão desproporcional e aumento ou redução de capital a preços diferenciados; e II – o perdão de dívida por liberalidade e sem justificativa negocial passível de comprovação; e III – a transmissão declarada como onerosa para pessoa que não comprove capacidade financeira para sua aquisição.
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Aqui, o PLP nº 108/2024 criou algumas hipóteses de presunção de doação para fins de incidência do ITCMD. Assim, o ITCMD passa a incidir sobre novas bases de cálculo, decorrentes de transmissões entre pessoas vinculadas de benefícios desproporcionais para sócio ou acionista por liberalidade e sem justificativa negocial que seja passível de comprovação. Está incluída expressamente a “distribuição desproporcional” de lucros ou dividendos, “cisão desproporcional e aumento ou redução de capital a preços diferenciados”. Estas modificações parecem querer coibir a distribuição desproporcional de lucros entre sócios que não tenham justificativa negocial (razões econômicas) passível de comprovação. Pela mesma razão, o PLP também inova ao fazer incidir o ITCMD sobre a cisão desproporcional, bem como o aumento ou a redução de capital de sociedades a preços diferenciados, igualmente, sem justificativa negocial e respectiva comprovação.
Em relação à distribuição desproporcional de lucros entre os sócios, o legislador determina no parágrafo 6º, inciso III, do Art.160 do mesmo PLP que se considera pessoa vinculada a própria pessoa jurídica em relação à pessoa física do sócio, titular ou quotista.
Portanto, neste aspecto, passa a ser altamente prudente que a distribuição desproporcional de lucros não seja prevista tão somente no contrato social e sim, que haja justificativa econômica (razão negocial) para que num determinado ano seja feita a distribuição desproporcional e que seja passível de demonstração.
Como justificativa econômica para a distribuição desproporcional de lucros pode ser a existência de um acordo de sócios, no qual fique estabelecida previamente entre os sócios as metas anuais de venda, redução de endividamento e aumento de lucros, por ex., e que seja ao final do período de apuração, demonstrado por meio de planilhas e outros documentos a contribuição de cada sócio e o respectivo valor de lucros atribuídos.
Agora, conforme consta do inciso II, parágrafo 5º, do Art. 160 acima, uma nova ampliação da base de incidência está prevista no PLP. nº 108/2024. Trata-se da incidência do ITCMD sobre o perdão de dívida entre pessoas vinculadas por mera liberalidade do credor, sem que haja uma justificativa negocial plausível e comprovada para o fato. Aqui o perdão da dívida é considerado como doação.
Finalizando este tópico, a transmissão de bens ou direitos declarada no instrumento de doação como onerosa para a pessoa que não comprove possuir plena capacidade financeira para sua aquisição passa a sofrer a tributação do ITCMD. É uma forma de o legislador evitar o mascaramento de uma operação onerosa de fato, com todos os reflexos sobre a incidência de outros impostos, além do desvirtuamento intencional do instituto da doação.
No quadro 3 abaixo são comparadas as hipóteses mais relevantes neste momento sobre a não incidência do ITCMD.
Quadro 3. Não incidência do ITCMD
Lei Paulista nº 10.705/2000 | PLP nº 108/2024 aprovado pela Câmara Federal em 13/08/2024 |
Artigo 5º – O imposto não incide:
I – na renúncia pura e simples de herança ou legado; II – sobre o fruto e rendimento do bem do espólio havidos após o falecimento do autor da herança ou legado; III – sobre a importância deixada ao testamenteiro, a título de prêmio ou remuneração, até o limite legal.
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Art. 163. O ITCMD não incide:
I – na extinção de usufruto ou de qualquer outro direito real que resulte na consolidação da propriedade plena sob titularidade do instituidor do direito; II – sobre aportes financeiros capitalizados sob a forma de planos de previdência privada a que se refere o inciso II do § 2º do art. 181 que tenham prazo superior a cinco anos contados da data do aporte até a ocorrência do fato gerador. (…) |
O Art. 163, inciso I, esclarece, de uma vez por todas, que o ITCMD não incide na extinção de usufruto que resulte na consolidação da propriedade plena, sob a titularidade do instituidor do direito. Esta era uma dúvida frequente dos cartorários de registro de imóveis para saber se o registro do cancelamento do usufruto por extinção, por ocasião da morte do usufrutuário, haveria ou não a incidência do ITCMD.
Na legislação paulista atual, a não incidência decorre de uma interpretação do Art. 2º da Lei nº 10.705/2000, no sentido de que o ITCMD só incide sobre a transmissão de qualquer bem ou direito havido por sucessão legítima ou testamentária, inclusive a sucessão provisória, além da doação.
Atualmente, não há previsão legal de incidência do ITCMD quando da consolidação da propriedade plena, ou da extinção do usufruto. Com a morte do usufrutuário, a propriedade plena se consolida na pessoa do nu-proprietário.
O inciso I do Art. 163 acima parece sepultar de uma vez por todas a dúvida sobre a não incidência do ITCMD na extinção do usufruto, ao afirmar expressamente que não incide o imposto por ocasião da extinção do usufruto, o que traria uma importante segurança jurídica aos contribuintes. Contudo, a condição precisa ser mais bem refletida e interpretada, podendo não significar a esperada segurança jurídica ao pagador de impostos. Observem que “o ITCMD não incide na extinção de usufruto …. que resulte na consolidação da propriedade plena sob titularidade do instituidor do direito” (negritamos). Aqui é possível a interpretação de que o ITCMD não incide na extinção do usufruto apenas quando houver a consolidação da propriedade plena sob a titularidade do instituidor do direito. Pode ser o caso de um pai que simplesmente doa ao filho um imóvel, sem reservas. Tempos depois, o filho resolve instituir o usufruto vitalício daquele imóvel em favor do pai, para que este possa administrar e usufruir plenamente da propriedade, enquanto vivo e capaz for. Ao falecer o pai se extingue o usufruto criado (instituído) pelo filho e a propriedade plena se consolida em favor do filho. É possível que seja esta extinção do usufruto aquela prevista no inciso I do Art. 163 do PLP aprovado pela Câmara. Assim, se não houver mudança de redação, esta será uma interpretação possível do dispositivo legal acima.
Já a interpretação do disposto no inciso II do Art. 163 supra deve ser combinada com o previsto no Art. 181, § 2º, inciso II, do projeto de lei complementar. Haverá incidência do ITCMD na transmissão dos planos de previdência privada e seguro pessoal, com cobertura por sobrevivência, estruturados sob regime financeiro de capitalização ou assemelhados, que tiverem menos de 5 anos contados da data do aporte até o fato gerador da transmissão. Apenas o VGBL – Plano Vida Gerador de Benefício Livre com mais de 5 anos na data da transmissão não sofrerá a incidência do ITCMD, em razão da não incidência expressa do inciso II do Art. 163 do PLP nº 108/2024.
Por último, o Art. 171 do PLP, transcrito no Quadro 4 abaixo, traz um importante esclarecimento aos contribuintes sobre a base de cálculo do imposto nas transmissões de quotas ou ações de sociedades, mas que ainda poderá ser alvo de discussões jurídicas se for aprovada a redação tal como está.
Quadro 4. Base de cálculo do ITCMD na transmissão de quotas ou ações
Lei Paulista nº 10.705/2000 | PLP nº 108/2024 aprovado pela Câmara Federal em 13/08/2024 |
Artigo 9º – A base de cálculo do imposto é o valor venal do bem ou direito transmitido, expresso em moeda nacional ou em UFESPs (Unidades Fiscais do Estado de São Paulo).
§ 1º – Para os fins de que trata esta lei, considera-se valor venal o valor de mercado do bem ou direito na data da abertura da sucessão ou da realização do ato ou contrato de doação. § 2º – Nos casos a seguir, a base de cálculo é equivalente a: 1. 1/3 (um terço) do valor do bem, na transmissão não onerosa do domínio útil; 2. 2/3 (dois terços) do valor do bem, na transmissão não onerosa do domínio direto; 3. 1/3 (um terço) do valor do bem, na instituição do usufruto, por ato não oneroso; 4. 2/3 (dois terços) do valor do bem, na transmissão não onerosa da nua-propriedade. (…) Artigo 13 – No caso de imóvel, o valor da base de cálculo não será inferior: I – em se tratando de imóvel urbano ou direito a ele relativo, ao fixado para o lançamento do Imposto sobre a Propriedade Predial e Territorial Urbana – IPTU; II – em se tratando de imóvel rural ou direito a ele relativo, ao valor total do imóvel declarado pelo contribuinte para efeito de lançamento do Imposto sobre a Propriedade Territorial Rural – ITR. (…) § 2º – O valor das ações representativas do capital de sociedades é determinado segundo a sua cotação média alcançada na Bolsa de Valores, na data da transmissão, ou na imediatamente anterior, quando não houver pregão ou quando a mesma não tiver sido negociada naquele dia, regredindo-se, se for o caso, até o máximo de 180 (cento e oitenta) dias. (Redação dada ao parágrafo pela Lei 10.992, de 21-12-2001; DOE 22-12-2001; Efeitos a partir de 01-01-2002) § 3º – Nos casos em que a ação, quota, participação ou qualquer título representativo do capital social não for objeto de negociação ou não tiver sido negociado nos últimos 180 (cento e oitenta) dias, admitir-se-á o respectivo valor patrimonial. (Redação dada ao parágrafo pela Lei 10.992, de 21-12-2001; DOE 22-12-2001; Efeitos a partir de 01-01-2002) |
Art. 171. No caso de quotas ou ações de emissão de pessoas jurídicas, ou no caso de empresário individual, a base de cálculo do ITCMD será determinada de acordo com as seguintes regras:
I – quando as quotas ou ações forem negociadas em mercados organizados de valores mobiliários, incluindo os mercados de bolsa e de balcão organizado, com mercado ativo nos noventa dias anteriores à data da avaliação, a base de cálculo corresponde à cotação de fechamento do dia anterior da avaliação, conforme definido na legislação estadual ou distrital; e II – nos demais casos, a base de cálculo deve ser calculada com metodologia tecnicamente idônea e adequada às quotas ou ações, inclusive o método técnico que contemple eventual perspectiva de geração de caixa do empreendimento, devendo o valor corresponder, no mínimo, ao patrimônio líquido ajustado pela avaliação de ativos e passivos a valor de mercado, acrescido do valor de mercado do fundo de comércio, conforme estabelecido na legislação do ente tributante. |
Este sempre foi um ponto muito controverso entre contribuintes e as Secretarias Estaduais da Fazenda, especialmente nos casos em que a ação, quota, participação ou qualquer título representativo do capital social não for objeto de negociação em Bolsa de Valores.
Segundo o inciso II do Art. 171 do PLP nº 108/2024, a avaliação das quotas ou ações de sociedades não negociadas em Bolsa de Valores, para fins de base de cálculo do ITCMD, deverá ser feita com base em metodologia tecnicamente idônea e adequada às quotas ou ações, devendo o método técnico contemplar eventual perspectiva de geração de caixa futuro.
O atrevimento da redação é tal que impõe como base de cálculo tributável mínima o valor do patrimônio líquido ajustado, acrescido do valor de mercado do fundo de comércio. Ou seja, quando as quotas ou ações de sociedades não forem negociadas em Bolsa de Valores, o valor da transmissão deve ser calculado com base no maior valor entre (a) o VPL – valor presente líquido do fluxo de caixa futuro descontado a uma determinada taxa de juros ou (b) pelo patrimônio líquido ajustado, considerando-se o valor das contas do ativo e passivo a preço de mercado, acrescido do fundo de comércio também a valor de mercado. Se houver negociação regular das ações ou quotas na Bolsa de Valores, a base de cálculo do ITCMD será o valor da cotação de fechamento no dia anterior ao da avaliação.
Ora, a redação é mesmo uma pérola! Vamos lá.
A primeira questão a ser levantada é o que deve ser entendida por “metodologia tecnicamente idônea e adequada às quotas ou ações” (negritamos). Se isso não bastasse, a projeto acrescenta que o método técnico deve contemplar eventual perspectiva de geração de caixa do empreendimento. Ora, nem a própria literatura contábil e econômica de “valuation” é unânime em relação a esses pontos. A perspectiva de geração de caixa é algo do futuro e, portanto, totalmente incerto e, por isso, não pode absolutamente ser fato gerador de imposto.
Pela Lei Paulista nº 10.705/2000 (atualmente em vigor), a determinação da base de cálculo do ITCMD, na transmissão de quotas ou ações de sociedades não negociadas em Bolsas de Valores, deve ser feita pelo valor patrimonial da participação, com base no balanço. Como os bens e direitos são sempre contabilizados a preço de custos e como não há mais correção monetária de balanços no Brasil, nas empresas menores o patrimônio líquido nem sempre reflete o valor atualizado da participação societária, o que vem gerando muita controvérsia entre fisco e contribuinte.
Para finalizar, uma palavra sobre a progressividade do ITCMD que, para alguns Estados já é obrigatória, agora passará a ser regra para todos. Com base no Art. 178 do PLP nº 108/2024, as alíquotas do ITCMD serão estabelecidas pela legislação estadual e distrital ainda a ser editada, devendo respeitar a alíquota máxima a ser fixada pelo Senado Federal. Essas alíquotas deverão ser obrigatoriamente progressivas em razão do valor do quinhão transmitido.
Quanto às eventuais deduções da base de cálculo, a lei paulista prevê que não serão abatidas quaisquer dívidas que onerem o bem transmitido, nem aquelas de responsabilidade do espólio. Por sua vez, o Art. 176 do PLP nº 108/2024 prevê a possibilidade de dedução das dívidas do falecido da base de cálculo do ITCMD, nos termos a ser estabelecido pela legislação do ente tributante.
Neste sentido, a nova lei procura restabelecer uma melhor justiça tributária, tendo em vista que as dívidas são de responsabilidade da massa do espólio, o que configura, numa linguagem apropriada da contabilidade, o patrimônio líquido transmitido. Assim, a rigor, é o patrimônio bruto, descontadas as dívidas, o montante transmitido e não o seu valor bruto sem a dedução das dívidas, como ocorre hoje.
Fonte:https://tributario.com.br/adabo/mudancas-no-itcmd-ja-aprovadas-na-camara-podem-impactar-as-holdings-familiares-questoes-praticas/