Por Robson Neves
1. Introdução
A Reforma Tributária aprovada no Brasil trouxe profundas mudanças no sistema de tributação sobre o consumo, instituindo novos tributos e alterando conceitos fundamentais. O artigo 4º da Lei Complementar que regulamenta a reforma trata do fato gerador, um dos elementos essenciais para a incidência tributária. Este artigo busca analisar a amplitude do conceito de fato gerador dentro da nova estrutura tributária, ao mesmo tempo em que critica interpretações que tentam ampliar seu alcance de forma inconstitucional.
2. O fato gerador e sua amplitude
O fato gerador é a ocorrência do evento que dá ensejo à obrigação tributária, ou seja, o ato ou fato que faz nascer o dever de pagar o tributo. Com a reforma, a sistemática do novo Imposto sobre Bens e Serviços (IBS) e da Contribuição sobre Bens e Serviços (CBS) ampliou a base de incidência, buscando abranger todas as operações que envolvam circulação econômica de bens e serviços.
A amplitude dessa definição busca assegurar que o sistema tributário seja mais uniforme, reduzindo as distorções e incentivando a neutralidade econômica. Dessa forma, o conceito de fato gerador passa a ser mais abrangente, permitindo que atividades antes não tributadas passem a ser incluídas no novo modelo.
No entanto, essa amplitude não pode ser confundida com ausência de limites. O fato gerador, por mais amplo que seja, deve respeitar parâmetros constitucionais e princípios fundamentais do direito tributário.
3. Os limites do fato gerador: uma crítica às interpretações expansivas
Algumas correntes defendem que, por conta da reforma, o conceito de fato gerador se tornou ilimitado, permitindo que qualquer operação econômica seja tributada sem necessidade de uma base legal específica. Tal visão é equivocada e pode levar a distorções inaceitáveis.
A Constituição Federal estabelece princípios que delimitam a tributação, incluindo:
- Legalidade Tributária (art. 150, I, CF/88) – Nenhum tributo pode ser cobrado sem que haja uma previsão legal clara do seu fato gerador.
- Capacidade Contributiva (art. 145, §1º, CF/88) – A tributação deve respeitar a aptidão econômica do contribuinte, evitando distorções que levem a uma tributação confiscatória.
- Segurança Jurídica e Vedação ao Confisco (art. 150, IV, CF/88) – A interpretação do fato gerador não pode resultar na criação de novas obrigações tributárias sem respaldo constitucional.
Dessa forma, qualquer tentativa de interpretação ampliativa do fato gerador sem base expressa na Constituição ou na legislação complementar pode ser considerada inconstitucional.
4. A inconstitucionalidade da interpretação ampliativa
A tentativa de expandir indefinidamente o conceito de fato gerador contraria a tradição do direito tributário, que exige precisão e previsibilidade na tributação. A ausência de limites abriria espaço para abusos na exigência de tributos, levando a uma insegurança jurídica prejudicial tanto para contribuintes quanto para a administração pública.
O Supremo Tribunal Federal (STF), ao longo dos anos, tem consolidado o entendimento de que a definição do fato gerador deve ser interpretada de forma objetiva, sem margem para expansões arbitrárias. A jurisprudência reforça que a tributação só pode ocorrer quando houver um evento específico previsto em lei como hipótese de incidência tributária.
Portanto, qualquer tentativa de ampliar a incidência do novo IBS e da CBS para situações não expressamente previstas seria uma afronta ao princípio da legalidade e ao devido processo legislativo.
5. Conclusão
A Reforma Tributária trouxe um novo paradigma na tributação sobre o consumo, tornando o fato gerador mais abrangente para evitar lacunas e distorções no sistema. No entanto, essa amplitude não significa ausência de limites. O fato gerador deve ser interpretado dentro dos contornos constitucionais, respeitando os princípios da legalidade, segurança jurídica e capacidade contributiva.
Interpretar o conceito de forma ilimitada seria não apenas inconstitucional, mas também contrário aos fundamentos do Estado Democrático de Direito, criando um ambiente de incerteza para contribuintes e agentes econômicos. Assim, o equilíbrio entre amplitude e limites é essencial para garantir que a tributação seja justa, previsível e em conformidade com os princípios fundamentais do direito tributário.
Fonte: https://tributario.com.br/ranneves/o-fato-gerador-na-reforma-tributaria-amplitude-e-limites-constitucionais/