O risco de modulação é uma realidade na advocacia tributária

Todo advogado sabe ou deveria saber que não há garantia de êxito em uma lide, inclusive a Ordem dos Advogados do Brasil proíbe e trata a promessa de sucesso como falta ética passível de punição pelo TED.

A advocacia tributária demanda constante especialização e atualização, pois o profissional, além de analisar a plausibilidade jurídica de determinada tese, deve considerar a possibilidade cada vez crescente da Suprema Corte modular os efeitos da decisão após julgar o tema.

Não raramente vemos temas tributários de impacto sofrendo algumas limitações temporais, cito como exemplo a “Tese do Século” – Tema 69, que em sede de embargos declaratórios teve os seus efeitos restringidos para após 15.03.2017, ressalvadas as ações judiciais e administrativas protocoladas até a data da sessão em que proferido o julgamento, cito a ementa:

EMENTA: EMBARGOS DE DECLARAÇÃO EM RECURSO EXTRAORDINÁRIO COM REPERCUSSÃO GERAL. EXCLUSÃO DO ICMS DA BASE DE CÁLCULO DO PIS E CONFINS. DEFINIÇÃO CONSTITUCIONAL DE FATURAMENTO/RECEITA. PRECEDENTES. AUSÊNCIA DE OMISSÃO, CONTRADIÇÃO OU OBSCURIDADE DO JULGADO. PRETENSÃO DE REDISCUSSÃO DA MATÉRIA. IMPOSSIBILIDADE JURÍDICA. MODULAÇÃO DOS EFEITOS. ALTERAÇÃO DE JURISPRUDÊNCIA COM EFEITOS VINCULANTES E ERGA OMNES. IMPACTOS FINANCEIROS E ADMINISRTATIVOS DA DECISÃO. MODULAÇÃO DEFERIDA DOS EFEITOS DO JULGADO, CUJA PRODUÇÃO HAVERÁ DE SE DAR DESDE 15.3.2017 – DATA DE JULGAMENTO DE MÉRITO DO RECURSO EXTRAORDINÁRIO 574.706 E FIXADA A TESE COM REPERCUSSÃO GERAL DE QUE “O ICMS NAO COMPÕE A BASE DE CÁLCULO PARA FINS DE INCIDÊNCIA DO PIS E DA COFINS” – , RESSALVADAS AS AÇÕES JUDICIAIS E PROCEDIMENTOS ADMINISTRATIVOS PROTOCOLADAS ATÉ A DATA DA SESSÃO EM QUE PROFERIDO O JULGAMENTO DE MÉRITO. EMBARGOS PARCIALMENTE ACOLHIDOS. (STF, RE 574706 ED, Relator(a): CÁRMEN LÚCIA, Tribunal Pleno, julgado em 13-05-2021, PROCESSO ELETRÔNICO DJe-160  DIVULG 10-08-2021  PUBLIC 12-08-2021).

Evidentemente que a modulação acima originou problemas de ordem prática, não raramente o contribuinte que ajuizou a demanda posteriormente a 15.03.2017 obteve uma decisão transitada em julgada reconhecendo o direito à compensação dos tributos pagos a maior a partir dos 5 (cinco) últimos anos anteriores à distribuição do processo.

Em função do exposto, o resultado não poderia ser diferente: Uma enxurrada de ações rescisórias movidas pela União a fim de limitar os efeitos da decisão transitada em julgado nos termos da modulação do STF em sede de embargos declaratórios, o que contribui para o aumento da insegurança jurídica, cito um acórdão do TRF-3 favorável ao Fisco, felizmente não houve a condenação do contribuinte em sucumbência, pois não deu causa à modulação:

E M E N T A AGRAVO INTERNO EM AÇÃO RESCISÓRIA. EXCLUSÃO DO ICMS DA BASE DE CÁLCULO DO PIS E DA COFINS. MODULAÇÃO: PEDIDO JULGADO PROCEDENTE, EM FAVOR DA UNIÃO (AUTORA). HONORÁRIOS ADVOCATÍCIOS: CONDENAÇÃO AFASTADA. RECURSO DESPROVIDO. 1. Caso em que a ré não deve ser condenada ao pagamento de honorários advocatícios porque não deu causa ao ajuizamento da demanda, já que a modulação referente aos efeitos do Tema 69-STF ocorreu após o trânsito em julgado do acórdão rescindendo. 2. Recurso desprovido. (TRF 3ª Região, 2ª Seção, AR – AÇÃO RESCISÓRIA – 5001997-05.2023.4.03.0000, Rel. Desembargador Federal LUIS ANTONIO JOHONSOM DI SALVO, julgado em 09/11/2023, DJEN DATA: 16/11/2023).

Visando ampliar os nossos estudos, trago à baia o Tema 745 envolvendo a aplicação do princípio da seletividade em função da essencialidade no tocante ao ICMS repassado nas contas de energia e telecomunicações a fim de reduzir as suas alíquotas, na ocasião a Suprema Corte limitou os efeitos do precedente às ações ajuizadas até o início do julgamento (05.02.2021), cito:

(…) 7. Modulação dos efeitos da decisão, estipulando-se que ela produza efeitos a partir do exercício financeiro de 2024, ressalvando-se as ações ajuizadas até a data do início do julgamento do mérito (5/2/21). (STF, RE 714139, Relator(a): MARCO AURÉLIO, Relator(a) p/ Acórdão: DIAS TOFFOLI, Tribunal Pleno, julgado em 18-12-2021, PROCESSO ELETRÔNICO REPERCUSSÃO GERAL – MÉRITO DJe-049  DIVULG 14-03-2022  PUBLIC 15-03-2022).

Logo, o contribuinte que aguardou a pacificação nada receberá, pois os efeitos do Tema 745/STF somente se aplicarão a partir do exercício financeiro de 2024, ressalvando apenas as ações ajuizadas até 05.02.2021, data de início do julgamento, certamente uma situação muito desconfortável para quem buscou alguma segurança jurídica.

Em função dessa postura da Suprema Corte em modular os efeitos das ações tributárias envolvendo risco orçamentário considerável (parte relevante delas), muitos advogados, que aqui me incluo, optam por ajuizar o quanto antes as ações, explicando aos clientes os riscos e sempre demonstrando a possibilidade de se impetrar um mandado de segurança para o fim de evitar a sucumbência com fulcro na Súmula 512 do próprio Supremo.

Evidentemente que eu compreendo e respeito o profissional que opta por aguardar a decisão final da Corte, no entanto, a costumeira cautela sugere que esse advogado informe ao contribuinte sobre a possibilidade de se ter uma modulação no futuro, expondo a ele a alternativa de se ingressar com a ação antes do julgamento.

Caso o cliente, ciente dos riscos, opte por aguardar, não há nada de errado em cumprir com a vontade dele, o que se deve evitar é gerar a amarga supressa de lá na frente o STF julgar favorável e modular os efeitos sem que o cliente conte com isso, pois evita-se um atrito desnecessário entre o causídico e o seu constituinte.

Portanto, está mais do que claro que o profissional que deseja atuar no direito tributário deve não somente considerar os riscos envolvendo o mérito, mas também a crescente possibilidade de modulação dos efeitos, porque de nada nos adianta aguardar uma decisão favorável e não conseguir receber ou restituir um centavo sequer em função de uma limitação temporal fixada pela Corte.

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