A Terceira Turma do Tribunal Regional Federal da 3ª Região (TRF3) decidiu a favor de uma usina de cana-de-açúcar produtora de etanol, reconhecendo que os rendimentos obtidos com a comercialização de Créditos de Descarbonização (CBIOs) devem ser classificados como receitas financeiras. A decisão garante que essas receitas sejam submetidas ao regime de apuração não-cumulativa, com alíquotas reduzidas para PIS/PASEP e COFINS, fixadas em 0,65% e 4%, respectivamente, conforme previsto no artigo 1º do Decreto 8.426/2015.
No julgamento, o relator, desembargador federal Rubens Calixto, destacou que a comercialização dos CBIOs não pode ser equiparada às receitas típicas provenientes da venda de bens e serviços. Segundo ele, os CBIOs são títulos emitidos como incentivo governamental para estimular a redução de emissões de dióxido de carbono, em linha com as metas assumidas pelo Brasil no Acordo de Paris. Trata-se de um crédito financeiro escriturado e negociado sob as diretrizes da Lei 13.576/2017 e regulamentado por normas específicas, como o Decreto 9.888/2019 e a Portaria MME nº 56/2022, afirmou o magistrado.
A controvérsia teve início em 2022, quando a usina impetrou mandado de segurança pedindo o reconhecimento da natureza financeira das receitas auferidas com a venda dos CBIOs, reivindicando a aplicação das alíquotas reduzidas. A Receita Federal, no entanto, sustentava que essas receitas estavam diretamente vinculadas à atividade principal da empresa, classificando os CBIOs como “ativos não monetários”. Diante desse entendimento, a 8ª Vara Cível Federal de São Paulo havia negado o pedido da usina, mantendo a tributação integral.
Ao recorrer ao TRF3, a empresa argumentou que a interpretação da Receita Federal contraria os objetivos do programa RenovaBio, que visa a incentivar práticas sustentáveis e a descarbonização da matriz de transportes do país. O relator do caso concordou com essa análise e apontou que o modelo do RenovaBio se baseia em três eixos fundamentais: metas de redução de emissões de gases de efeito estufa, certificação da produção de biocombustíveis e emissão de Créditos de Descarbonização.
Com a decisão unânime da Terceira Turma, a sentença de primeira instância foi reformada, assegurando à usina o direito de compensar ou restituir os valores pagos indevidamente nos cinco anos anteriores ao ajuizamento da ação, com base na Súmula 213 do STJ. A devolução dos valores deverá ocorrer na esfera administrativa, mediante procedimento de comprovação e liquidação dos montantes.
Especialistas apontam que a decisão traz segurança jurídica para o setor, especialmente em um contexto em que o governo brasileiro tem em vista ampliar o incentivo às práticas sustentáveis. A classificação dos CBIOs como receitas financeiras pode representar um precedente relevante para outras empresas que operam sob o programa RenovaBio, facilitando a utilização das alíquotas reduzidas de PIS/Pasep e COFINS para essas operações.
Apelação Cível 5028277-80.2022.4.03.6100