Novas regras de compensação fiscal introduzidas pelo governo (MP 1.202) desafiam contribuintes e sistema tributário

Em uma manobra relevante, (para não dizer desesperadora) com vistas a tentar equalizar as contas públicas, o Governo Federal, por meio da Medida Provisória nº 1.202, inseriu o artigo 74-A na Lei nº 9.430, trazendo mudanças relevantes na compensação de créditos tributários decorrentes de decisões judiciais transitadas em julgado.

Tal medida concede ao Ministério da Fazenda a prerrogativa de estabelecer limites mensais na Declaração de Compensação (DCOMP).

Trazemos aqui alguns comentários não exaustivos sobre o novo dispositivo legal.

Os parâmetros estabelecidos pela MP indicam que não haverá um limite único para todos os contribuintes; ao contrário, a limitação será graduada conforme o valor total do crédito judicial. Ademais, o limite mensal não será inferior a 1/60 do valor total do crédito e a limitação não se aplicará a créditos totais inferiores a 10 milhões de reais.

Contudo, a legislação não especifica o momento de atualização do crédito judicial para a aplicação desses limites, um detalhe que deve ser regulamentado pela Receita Federal. Como sabemos, a RFB quase sempre traz alguma “artimanha” na regulamentação das leis, legislando a seu favor. Isso ainda pode trazer mais “pimenta” para o assunto.

Como também é de conhecimento, conforme previsto nos artigo 78 conjugado com o artigo 144, ambos da Instrução Normativa n° 2.055, caso a compensação seja considerada como não declarada, o sujeito passivo não poderá apresentar defesa administrativa com efeito suspensivo.

Nesse contexto, a adição pela nova MP, do inciso “X” ao parágrafo 3º do art. 74 da Lei nº 9.430, que diz que os valores de crédito utilizados na compensação que superem o limite mensal não serão considerados, criará um risco de inadimplemento fiscal que, por obvio, deverá agora ficar no radar das empresas, já que (sem o devido monitoramento) podem ver o possível débito compensado ser encaminhado diretamente para inscrição em dívida ativa.

Assim, em nossa opinião, a Medida Provisória nº 1.202 introduz uma dinâmica complexa e bem desafiadora (para não dizer outra coisa) no âmbito da compensação de créditos tributários, levantando também algumas questões significativas sobre a constitucionalidade e a eficácia das decisões judiciais em matéria fiscal. Por exemplo, ela claramente viola, em nosso sentir, o princípio da isonomia tributária, ao trazer clara diferenciação entre créditos judiciais e outros indébitos tributários. Qualquer crédito do contribuinte perante a fazenda deve (ou pelo menos deveria) ser tratado de igual forma, com justiça e agilidade.

O fato é que as repercussões jurídicas da MP 1.202 são complexas e imprevisíveis. É provável que debate jurídico que se segue terá implicações profundas para a Fazenda Pública, sistema judiciário e para os contribuintes, restando para estes últimos recorrer ao judiciário e aguardar com expectativa as futuras decisões das Cortes sobre a validade e aplicabilidade desta nova e polemica regulamentação.

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